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A Jóia Suprema do Discernimento – Shankara


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A Jóia Suprema do Discernimento (Viveka Chuda Mani)

 The Protective Eye of Horus Papyrus Painting

Shankara

Índice

Índice __________________________________________________________________ 1 Prefácio _______________________________________________________________________ 2 I Shankara________________________________________________________________ 3 II A Filosofia do Não-Dualismo________________________________________________________________ 5

O espírito da filosofia de Shankara ______________________________________________ 5 A natureza da aparência de mundo _______________________________________________________________________ 6 Sobreposição, ou Maya___________________________________________________________________ 7 Maya: uma declaração de fato e de princípio _______________________________________________________________________ 8 Brahman e Iswara__________________________________________________________________ 9 O problema do mal _______________________________________________________________________ 11 A meta suprema _______________________________________________________________________ 12 Métodos e meios _______________________________________________________________________ 14

III A Jóia Suprema do Discernimento ______________________________________________ 15

A senda___________________________________________________________________ 15 O discípulo _________________________________________________________________________ 16 O mestre____________________________________________________________________ 17 As perguntas ________________________________________________________________________ 18 Atman e não-Atman _________________________________________________________________________ 19 Vigília, sono, sono sem sonhos _________________________________________________________________________ 20

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Maya_______________________________________________________________________ 22 O Atman______________________________________________________________________ 23 A mente ___________________________________________________________________________ 24 O corpo_______________________________________________________________________ 25 Purificação___________________________________________________________________ 26 O invólucro do intelecto ____________________________________________________________________________ 27 Ilusão ____________________________________________________________________________ 28 O invólucro da bem-aventurança ____________________________________________________________________________ 29 Atman é Brahman_____________________________________________________________________ 29 O universo ___________________________________________________________________________ 30 Eu sou Brahman ___________________________________________________________________________ 31 Isso és Tu ___________________________________________________________________________ 31 Devoção ___________________________________________________________________________ 33 Falsa identificação___________________________________________________________________ 35 O ego _____________________________________________________________________________ 35 Desejos _____________________________________________________________________________ 36 Recolhimento___________________________________________________________________ 37 Rejeição das aparências _____________________________________________________________________________ 37 A corda e a cobra _____________________________________________________________________________ 38 Samadhi _____________________________________________________________________________ 39 Controle interior e exterior _____________________________________________________________________________ 40 O um__________________________________________________________________________ 42 Libertação ____________________________________________________________________________ 42 O mundo fantasma ____________________________________________________________________________ 43 União com Brahman_________________________________________________________________ 43 Desprendimento ________________________________________________________________________ 44 Impassibilidade ________________________________________________________________________ 44 Iluminação _________________________________________________________________________ 45 A cessação do sonho _________________________________________________________________________ 46 A flecha não se deterá____________________________________________________________________ 46 Brahman é tudo_____________________________________________________________________ 47 O discípulo se rejubila ________________________________________________________________________ 48 A jóia suprema ________________________________________________________________________ 51

IV Shankara formula e responde a algumas importantes perguntas _________________________ 55

Prefácio

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A Jóia Suprema do Discernimento é um texto clássico do Vedanta a respeito do caminho para Deus através do conhecimento. Seu ensinamento básico é o de que só Deus é a realidade que a tudo permeia; a alma individual não é outra senão a alma universal.

Shankara (686-718 d.C.) representa uma fonte proeminente da sabedoria oriental. Ele desfruta de enorme popularidade devido à maneira clara e racional com que aborda temas relacionados com a religião.

No entanto, como este livro irá mostrar, ele também era capaz de grande devoção. Renúncia, discernimento, autocontrole – são estas as suas senhas. Alguns talvez não se agradem da sua austeridade, sobretudo nas partes iniciais do diálogo que ele mantém com um provável discípulo; mas é justamente essa severidade que serve de valioso corretivo para os perigos do sentimentalismo fácil.

Shankara não tem ilusões a respeito deste mundo de Maya; ele condena seus aparentes prazeres com uma franqueza brutal. Por essa razão é que ele consegue descrever com tanta intensidade a completa transformação do universo que acontece diante dos olhos do iluminado, na qual o mundo se toma, de fato, um paraíso. Depois de árduos embates, o discípulo da Jóia Suprema alcança a realização, e o livro de Shankara termina com a magnífica explosão da sua alegria.

******

Ó Senhor, que habitais em nosso íntimo Vós sois a luz
No lótus do coração.
Om é o vosso eu,
Om, a mais sagrada das palavras, Origem e fonte das escrituras.
Não pode a lógica descobrir-vos,
Ó Senhor, mas os iogues
Vos conhecem na meditação.
Em vós estão todas as faces de Deus, Suas formas e aspectos;
Em vós também Encontramos o guru.
Estais em todos os corações
E se, uma vez que seja,
Um homem abrir
Sua mente para receber-vos,
Em verdade esse homem
Será livre para sempre.

I Shankara

Shankara

Magníficas e fantásticas nuvens de lenda cercam a figura austera, fascinante e pueril de Shankara – santo, filósofo e poeta. Mas, historicamente falando, sabemos muito pouco sobre as circunstâncias de sua vida.

Shankara nasceu em ou por volta de 686 a.D., de pais brâmanes, em Kaládi, vilarejo do Malabar Ocidental, no Sul da índia. Aos dez anos já era um prodígio acadêmico. Não só tinha lido e decorado todas as escrituras como escrevera comentários sobre muitas delas e travara discussões com renomados eruditos que de todas as partes do país acorriam para vê-lo.

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Mas o menino estava insatisfeito. Numa época em que a maioria das crianças ainda mal começara a estudar, já ele estava descontente com o vazio do conhecimento livresco. Ele viu que seus professores não praticavam as sublimes verdades que pregavam. De fato, toda a sociedade em que ele vivia era materialista e dada à busca dos prazeres. A índia estava passando por um período de decadência espiritual. Shankara, ardendo de zelo juvenil, resolveu fazer de sua vida um exemplo que pudesse reconduzir os homens à senda da verdade.

Por essa época, seu pai faleceu. O menino se viu às voltas com o enigma da vida e da morte, e decidiu decifrá-lo. Iria renunciar a tudo em sua busca do significado da existência. Foi então que escreveu o poema Moha Mudgarwn – O Fim da Ilusão. Eis uma tradução mais ou menos literal desse poema:

Quem é a esposa? Quem é o filho?
Estranhos são os caminhos deste mundo.
Quem és tu? De onde vieste?
Vasta é a ignorância, meu bem-amado.
Medita, pois, sobre essas coisas e adora o Senhor.

Vê a loucura do Homem:
Na infância ocupado com seus brinquedos,
Na juventude seduzido pelo amor,
Na maturidade curvado sob as preocupações –
E sempre negligente com o Senhor!
As horas voam, as estações passam, a vida se escoa,
Mas a brisa da esperança sopra continuamente em seu coração.

O nascimento traz a morte, a morte traz o renascimento: Esse mal não necessita de prova.
Onde, pois, ó Homem, está a tua felicidade?
Esta vida tremula na balança

Qual orvalho numa folha de lótus –
Não obstante, o sábio pode nos mostrar, num instante, Como atravessar esse mar de mudanças.

Quando o corpo se cobre de rugas, quando o cabelo encanece, Quando as gengivas perdem os dentes, e o bordão do ancião Vacila sob o seu peso como um caniço,
A taça do seu desejo ainda está cheia.

Teu filho pode trazer-te sofrimento,
Tua riqueza não te garante o céu:
Não te vanglories, pois, de tua riqueza, Nem de tua família, nem de tua juventude – Todas elas passam, todas hão de mudar. Sabe isso e sê livre.

Entra na alegria do Senhor.

Não busques a paz nem a discórdia
Com amigos ou parentes.
Ó bem-amado, se queres alcançar a liberdade, Sê igual em tudo.

Shankara então persuadiu sua mãe a deixá-lo consagrar-se à vida monástica, prometendo ir visitá-la antes que ela morresse. Depois, tendo providenciado o indispensável às suas necessidades, partiu em busca de um mestre.

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Às margens do rio Narmada encontrou Gaudapada, célebre filósofo e vidente que alcançara o conhecimento da Realidade. Shankara pediu ao velho sábio que se encarregasse de sua iniciação, mas Gaudapada recusou-se a atendê-lo. Fizera voto de permanecer absorto na união com Brahman. Enviou, porém, o menino ao seu principal discípulo, Govindapada. Govindapada iniciou-o e instruiu-o na meditação e no inteiro processo da Ioga. Em pouco tempo Shankara alcançou a completa realização mística e começou ele próprio a ensinar.

Uma manhã, quando ia banhar-se no Ganges, encontrou um Chandala, um membro da mais baixa das castas, a dos intocáveis. O homem trazia consigo quatro cachorros, que bloqueavam o caminho de Shankara. Por um momento, o inato preconceito de casta se fez valer. Shankara, o Bruhmin, ordenou ao Chandala que saísse do seu caminho. Mas o Chandala retrucou: – Será um só Deus, como pode haver muitas espécies de homens?” Shankara encheu-se de vergonha e reverência, e prostrou-se diante do Chandala. Esse incidente inspirou um dos mais belos poemas de Shankara, o Manisha Panchaka, composto de cinco estrofes, cada qual terminando com o refrão:

Quem aprendeu a ver em toda parte a Existência única, Esse é o meu mestre, seja ele Brahmin ou Chandala.

Shankara começou a ensinar entre os eruditos do país, convertendo primeiro os professores, depois os alunos destes. Um deles era o famoso filósofo Mandan Misra. Mandan Misra afirmava que a vida do chefe de família era muito superior à do monge, e sua opinião era largamente respeitada e compartilhada em toda a índia. Shankara resolveu discutir com ele e dirigiu-se à sua casa. Ali chegando, encontrou as portas fechadas. Misra estava celebrando uma cerimônia religiosa e não queria ser incomodado. Shankara, com o espírito travesso de um adolescente, subiu numa árvore próxima e dali saltou para dentro do pátio. Misra percebeu-o no meio da multidão. Ele não gostava de monges – principalmente quando eram tão jovens – e perguntou sarcasticamente: – De onde vem essa cabeça raspada?” – O senhor tem olhos para ver -, respondeu Shankara com insolência. “A cabeça raspada vem do pescoço.- Misra ficou irritado, mas Shankara continuou a provocá-lo, até que os dois concordaram em travar um debate a respeito dos méritos concernentes às vidas do monge e do chefe de família. Ficou assentado que Shankara, se perdesse, se tomaria chefe de família, e que Misra, se fosse ele o perdedor, se tomaria monge. O debate durou vários dias. Bharati, a culta esposa de Misra, serviu de árbitro. Por fim, Shankara conseguiu convencer Misra da superioridade da vida monástica e Misra tomou-se seu discípulo. Foi ele quem más tarde anotou os comentários de Shankara sobre os Brahma-Sutras.

Shankara terminou seus dias em Kedamath, no Himalaia. Ao morrer, tinha apenas 32 anos. Durante esse breve período, fundara vários mosteiros e criara dez ordens monásticas. Foi essa a primeira vez em que se organizou o monasticismo na Índia, e o sistema de Shankara perdura até hoje. Shankara era mais um reformador que um inovador. Não pregou nenhuma nova doutrina ou credo. Mas deu um novo impulso à vida espiritual do seu tempo. Separados por intervalos de milhares de anos, como três picos formidáveis, Buda, Shankara e Ramakrishra avultam na cordilheira da história religiosa da índia.

A produção literária de Shankara foi enorme. Não só teceu comentários sobre os Vedanta-Sutras, os principais Upanishads e o Bhagavad-Gita como produziu duas importantes obras filosóficas, o Upadeshasahasn e o Vívekachuda (A Jóia Suprema do Discernimento). Deixou-nos também vários poemas, hinos, preces e obras menores sobre o Vedanta.

A Jóia Suprema do Discernimento foi escrito inteiramente em versos, provavelmente para facilitar sua memorização pelos discípulos. Os versos são longos e a métrica é complicada. Preferimos não tentar reproduzi-los em nossa tradução. A mensagem de Shankara é infinitamente mais importante do que sua forma literária: a clareza foi a nossa única preocupação. Por isso não hesitamos em parafrasear e ampliar o texto sempre que isso nos pareceu necessário. No todo, porém, a tradução permanece muito fiel ao original.

II
A Filosofia do Não-Dualismo

O espírito da filosofia de Shankara

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“Brahman – a existência, o conhecimento e a aventurança absolutos – é real. O universo não é real. Brahman e Atman (o eu profundo do homem) são unos.

Nestas palavras Shankara sintetiza sua filosofia. Quais as implicações dessa assertiva? Que entende ele por “real” e por “irreal”?

Shankara só aceita como “real” aquilo que não muda nem cessa de existir. Ao formular essa definição, ele segue os ensinamentos dos Upanishads e de Gaudapada, seu predecessor. Nenhum objeto, nenhum tipo de conhecimento pode ser absolutamente real se sua existência for meramente temporária. A realidade absoluta implica a existência permanente. Se considerarmos nossas múltiplas experiências durante os estados de vigília e de sono, verificaremos que as experiências durante o sono são negadas pelas experiências no estado de vigília e vice-versa – e que ambos os tipos de experiência cessam durante o sono sem sonhos. Noutras palavras, qualquer objeto de conhecimento, externo ou interno – pois um pensamento ou idéia é um objeto de conhecimento tanto quanto o mundo exterior -, está sujeito a modificação e, portanto, segundo a definição de Shankara, é “irreal”.

Qual é, então, a Realidade subjacente às nossas experiências? Só existe uma coisa que nunca nos abandona – a consciência profunda. Este é o único aspecto constante de toda experiência. E essa consciência é o Eu real, o Eu absoluto. Mesmo no sono sem sonhos o Eu real está presente como uma testemunha, ao passo que a consciência do ego a que chamamos “nós mesmos”, nossa individualidade, ficou temporariamente submersa na ignorância (avidya) e desapareceu.

A filosofia Vedanta ocupa uma posição central entre o realismo e o idealismo. O realismo e o idealismo ocidentais assentam ambos na distinção entre mente e matéria; a filosofia indiana colocou a mente e a matéria na mesma categoria – ambas são objetos do conhecimento. Não se deve, porém, considerar Shankara como um precursor de Berkeley: ele não diz que o mundo é irreal simplesmente porque sua existência depende da nossa percepção. O mundo, de acordo com Shankara, “é e não é”. Sua realidade fundamental só pode ser compreendida em relação à experiência mística final, a experiência da alma iluminada. Quando a alma iluminada mergulha na consciência transcendental, ela percebe o Eu (o Atman) como pura beatitude e pura inteligência, o “Um sem um segundo “. Nesse estado de consciência, toda percepção da multiplicidade chega ao fim, toda distinção entre “meu e seu” deixa de existir; o mundo como usualmente o conhecemos desaparece. Então o Eu resplandece como o único, a Verdade, o Brahman, a base desta aparência de mundo.

A aparência de mundo tal como a experimentamos no estado de vigília pode ser comparada, diz Shankara, a uma suposta cobra que, examinada mais de perto, revela ser um simples rolo de corda. Quando a verdade é conhecida, deixamos de ser iludidos pela aparência – a aparência de cobra desaparece na realidade da corda, o mundo desaparece em Brahman.

Outros sistema de filosofia hindu – Shankya, Yoga ou Nyaya – afirmam que o mundo fenomenal possui uma realidade objetiva, muito embora esta possa não ser visível aos olhos de uma alma iluminada. O Advaita Vedanta difere desses sistemas neste ponto vital: ele nega a realidade última do mundo do pensamento e da matéria. Mente e matéria, objetos finitos e suas relações, são uma compreensão errônea de Brahman, e nada mais – eis o que Shankara ensina.

A natureza da aparência de mundo

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Quando Shankara afirma que o mundo do pensamento e da matéria não é real, não está querendo dizer que ele não existe. A aparência de mundo é e não é. No estado de ignorância (nossa consciência de todos os dias) ele é vivenciado, e existe tal como nos aparece. No estado de iluminação ele não é vivenciado, e deixa de existir. Shankara não vê nenhuma experiência como inexistente enquanto ela é vivenciada, mas deduz naturalmente uma distinção entre as ilusões particulares do indivíduo e a ilusão universal ou ilusão do mundo. À primeira ele chama pratibhasika (ilusória); à segunda, vyavaharika (fenomenal). Por exemplo, os sonhos de um homem são as suas ilusões particulares; quando ele acorda, elas deixam de existir. Mas a ilusão universal – a ilusão do mundo fenomenal – persiste durante toda a vida de vigília do homem, a não ser que ele se conscientize da Verdade mediante o conhecimento de Brahman. Além disso, Shankara estabelece uma distinção entre esses dois tipos de ilusão e as idéias que são totalmente irreais e imaginárias, que representam uma impossibilidade total ou uma flagrante contradição de termos – como o filho de uma mulher estéril.

Estamos, pois, diante de um paradoxo – o mundo é e não é. Ele não é nem real nem inexistente. E, não obstante, esse aparente paradoxo é simplesmente a afirmação de um fato – fato que Shankara denomina Maya. Esse Maya, essa aparência de mundo tem sua base em Brahman, o eterno. O conceito de Maya se aplica unicamente ao mundo fenomenal, que, segundo Shankara, consiste em nomes e formas. Ele não é inexistente, porém difere da Realidade, Brahman, da qual depende para a sua existência. Ele não é irreal, visto que desaparece à luz do conhecimento da sua base eterna. A aparência de inundo é Maya; só o Eu, o Atman, é real.

Sobreposição, ou Maya

O mais difícil dentre todos os problemas filosóficos é o da relação entre o finito e o Infinito, o problema de como este mundo finito veio a existir. Se acreditamos que o finito tem uma realidade própria absoluta e que ele se origina do Infinito e é uma verdadeira transformação do Infinito, ou se consideramos o Infinito como urna primeira causa transcendental do mundo fenomenal (posição sustentada pela maioria dos teólogos cristãos), então temos de admitir que o Infinito já não é infinito. Um Deus que se transforma a Si mesmo no universo visível está Ele próprio sujeito à transformação e à mudança – não se pode considerá-lo corno a realidade absoluta. Um Deus que cria um mundo limita a Si mesmo pelo próprio ato da criação, e portanto deixa de ser infinito. A pergunta “Por que Deus haveria de criar?” permanece sem resposta.

Essa dificuldade é superada, porém, se considerarmos o mundo como Maya. E esta explicação do nosso universo está, além do mais, em perfeito acordo com as descobertas da ciência moderna – que se podem resumir assim:

“Uma bolha de sabão com irregularidades e rugas em sua superfície é talvez a melhor imagem do novo universo que nos foi revelado pela teoria da relatividade. O universo não é o interior da bolha de sabão, mas a sua superfície – e a substância da qual a bolha é soprada, a película de sabão, é um espaço vazio fundido o tempo vazio.”1

Deste modo, só quando analisamos a natureza do Universo e o descobrimos como Maya – nem absolutamente real, nem absolutamente inexistente – é que compreendemos como a superfície fenomenal da bolha de sabão salvaguarda a eterna presença do Absoluto. Os Upanishads, é verdade, parecem considerar Brahman como a causa primeira do universo, tanto material como eficiente. Afirmam eles que o universo emana do Brahman absoluto, subsiste nele e, finalmente, funde-se com ele. Shankara nunca nega diretamente os Upanishads, mas explica diferentemente essas afirmações. O universo, diz ele, é uma sobreposição a Brahman. Brahman permanece eternamente infinito e imutável. Não está transformado neste universo. Ele simplesmente aparece a nós como este universo, na nossa ignorância. Nós sobrepomos o mundo aparente a Brahman do mesmo modo que às vezes sobrepomos urna cobra a um rolo de corda.

1 Sir Jarnes Jeans.

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Essa teoria da sobreposição (vivartavada) está indissoluvelmente ligada à teoria da causalidade. A relação causal existe no mundo da multiplicidade, que é Maya. No interior de Maya, a mente não pode funcionar sem urna relação causal. Mas falar de causa e efeito com referência ao Absoluto é simplesmente absurdo. Buscar saber o que causou o mundo é transcender o mundo; buscar encontrar a causa de Maya é ir além de Maya – e, quando o fazemos, Maya desaparece, porquanto o efeito deixa de existir. Como, então, pode haver urna causa de um efeito inexistente? Em outras palavras, a relação entre Brahman e Maya é, pela sua própria natureza, incognoscível e indefinível por qualquer processo do intelecto humano.

Maya: uma declaração de fato e de princípio

Portanto, segundo Shankara, o mundo do pensamento e da matéria possui uma existência fenomenal ou relativa e está sobreposto a Brahman, a realidade única, absoluta. Enquanto permanecermos na ignorância (isto é, enquanto não tivermos realizado a consciência transcendental), continuaremos a experimentar este mundo aparente, que é o efeito da sobreposição. Quando se realiza a consciência transcendental, a sobreposição cessa.

Qual a natureza dessa sobreposição? Na introdução ao seu comentário sobre os Brahma Sutras, Shankara nos diz que “sobreposição é a apresentação aparente à consciência, pela memória, de algo que foi anteriormente observado em alguma outra parte”. Vemos uma cobra. Lembramo-nos dela. No dia seguinte, vemos um rolo de corda. Sobrepomos a ela a lembrança da cobra e desse modo falseamos a sua natureza.

Shankara antecipa uma objeção à sua teoria e trata de refutá-la. Podemos desafiar a teoria da sobreposição afirmando que Brahman não é um objeto de percepção. Como podemos sobrepor uma cobra a uma corda que não percebemos? Como podemos sobrepor uma aparência de mundo a uma realidade que não é visível aos nossos sentidos? “Porque todo homem sobrepõe objetos a outros objetos conforme estes se apresentam à sua percepção (isto é, conforme entram em contato com seus órgãos sensoriais)”.- A isso Shankara responde: “Brahman não é, replicamos nós, não-objetivo no sentido absoluto. Porque Brahman é o objeto da idéia do ego. Sabemos perfeitamente, por intuição, que o Eu profundo existe, já que a idéia do ego é uma representação do Eu. Nem é uma regra absoluta que objetos possam ser sobrepostos apenas a outros objetos tal como eles se nos apresentam; porque as pessoas ignorantes sobrepõem um azul-escuro ao céu, que não é um objeto de percepção sensorial”.

Esta afirmação requer alguma explicação adicional. Embora Brahman nunca seja visível à nossa percepção sensorial do dia-a-dia, existe um modo no qual estamos cônscios da realidade: o Eu profundo. Brahman, como ficou dito, é a existência, o conhecimento e a bem-aventurança absoluta. SÓ na consciência transcendental podemos perceber isso plenamente. No entanto, Brahman é parcialmente visível também à nossa consciência normal. Brahman é Existência, e todos sabemos que existimos. Neste sentido, cada um de nós tem um conhecimento intuitivo do Eu profundo (o Atman, ou Brahman-dentro-da-criatura). Porém o Eu profundo, a realidade, nunca é um objeto da percepção sensorial – porque na nossa ignorância, sobrepomos a idéia de uma individualidade particular – a de ser o Sr. Smith ou a Sra. Jones – à nossa percepção da Existência. Somos incapazes de compreender que a Existência não é nossa propriedade particular, que ela é universal e absoluta. O Eu profundo, portanto, está presente na nossa consciência normal como “o objeto da idéia do ego” tradução literal da frase de Shankara. A sobreposição da idéia do ego à Existência constitui o nosso primeiro e mais importante ato como seres humanos. No momento em que praticamos esse ato central de sobreposição – no momento em que dizemos “eu sou eu, sou um ente particular, sou separado, sou um indivíduo”, estabelecemos uma espécie de reação em cadeia que torna inevitáveis novas sobreposições. A reivindicação da nossa individualidade implica a presença da individualidade em toda parte. Ela sobrepõe automaticamente um mundo múltiplo de criaturas e objetos à realidade única, não-dividida, à Existência que é Brahman. Idéia do ego e aparência de mundo dependem um do outro. Abandone a idéia do Ego na consciência transcendental, e a aparência de mundo deve necessariamente desaparecer.

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Quando e como ocorreu esse ato de sobreposição? Foi no nosso nascimento individual ou numa vida anterior? Foi num momento histórico – correspondente à história da queda de Adão – em que o mundo fenomenal veio a existir como decorrência da idéia do ego? A futilidade de semelhantes perguntas se evidencia por si mesma. Andamos meramente à volta de um círculo. O que é essa aparência de mundo Maya? Quem o criou? A nossa ignorância. O que é essa ignorância? Maya, igualmente. Se houve, há e sempre haverá uma realidade imutável, como podemos admitir que Maya teve início num momento histórico específico? Não podemos.

Devemos pois concluir, como Shankara, que Maya, a exemplo de Brahman, não teve começo. A ignorância como causa e a aparência de mundo como efeito sempre existiram e sempre existirão. São como a semente e a árvore. A “conexão entre o real e o irreal” produzida pela nossa ignorância é um processo universalmente manifesto em nossa vida diária. Shankara diz: “É óbvio, e não precisa de provas, o fato de que o objeto que é o não-ego e o sujeito que é a idéia do ego (sobreposta ao Eu) são opostos um ao outro como a luz e as trevas. Não se pode identificá-los, e muito menos seus respectivos atributos”. No entanto, é próprio do homem (devido ao seu conhecimento errôneo) não poder diferenciar entre essas entidades distintas e seus respectivos atributos. Ele sobrepõe a um a natureza e os atributos do outro, ligando o real ao irreal e servindo-se de expressões como “eu sou isto”, “isto é meu”.

Shankara fala aqui de dois estágios inerentes ao processo de sobreposição. Primeiro a idéia do ego é sobreposta ao Eu profundo, à existência-realidade. Depois a idéia do ego, exteriorizando-se, por assim dizer, identifica-se com o corpo e com os atributos e as ações físicas e mentais do corpo. Dizemos, como se fosse a coisa mais natural, “eu sou gordo”, “eu estou cansado”, “eu estou andando”, “eu estou sentado”, sem nos determos para considerar o que vem a ser esse “eu”. E vamos mais longe. Reivindicamos como nossos objetos e condições puramente exteriores. Declaramos que “eu sou republicano” ou que “esta casa é minha”. À medida que se multiplicam as sobreposições, afirmações insólitas tomam-se possíveis e normais – tais como “afundamos ontem três submarinos” ou “tenho um excelente seguro”. De certo modo, identificamos o nosso ego com cada objeto do universo. E, enquanto isso, o Eu profundo atua como espectador, totalmente dissociado desses esgares e disposições de ânimo – mas tomando-os possíveis pelo fato de proporcionar à mente aquela luz da consciência sem a qual Maya não poderia existir.

Que Maya não tem princípio pode ser igualmente demonstrado se retomarmos por um momento a imagem da corda e da cobra. A sobreposição da cobra à corda só é possível se pudermos lembrar da aparência da cobra; uma criança que nunca viu uma cobra nunca faria essa sobreposição. Como pode o recém-nascido, então, sobrepor a “cobra” (aparência de mundo) à “corda” (Brahman)? Só poderemos responder a essa pergunta se postularmos uma “memória da cobra” universal, comum a toda a humanidade e existente desde um tempo sem princípio. Essa “memória da cobra” é Maya.

Maya, diz Shankara, é não apenas o universal mas também o que não tem princípio nem fim. No entanto, deve-se fazer uma distinção entre Maya como princípio universal e a ignorância (avidya), que é individual. A ignorância individual não tem princípio, mas pode terminar a qualquer momento: ela desaparece quando o homem alcança a iluminação espiritual. Desse modo, o mundo pode desaparecer da consciência de um indivíduo e ainda assim continuar a existir para o resto da humanidade. Nisso a filosofia de Shankara difere essencialmente do idealismo subjetivo do Ocidente.

Brahman e Iswara

Em certo sentido, Brahman é a causa primordial do universo -já que, pela ação de Maya, a aparência de mundo é sobreposta a Brahman. Brahman é a causa, Maya, o efeito. Todavia, não se pode dizer que Brahman. se transformou no mundo ou que o criou, porque a Realidade absoluta é, por definição, incapaz de ação ou de mudança temporal. Outra palavra, lswara, pode pois ser empregada para descrever o princípio criativo. lswara é Brahman unido a Maya – a combinação de Brahman e seu poder que cria, preserva e dissolve o universo num processo sem princípio e sem fim. lswara é Deus personificado, Deus com atributos.

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De acordo com o sistema de filosofia Sankhya, o universo é uma evolução da Prakriti – matéria indiferenciada, composta de três forças chamadas gunas. A criação é uma perturbação no equilíbrio dessas forças. As gunas começam a passar por uma enorme variedade de combinações – mais ou menos como na teoria ocidental da estrutura atômica – e essas combinações constituem os elementos, os objetos e as criaturas individuais. Esse conceito da Prakriti corresponde, até certo ponto, ao conceito de Maya formulado por Shankara, mas com esta importante diferença: Prakriti é considerada distinta e independente de Purusha (a Realidade absoluta), enquanto Maya é vista como destituída de realidade absoluta, mas como dependente de Brahman. Portanto, é lswara, e não Prakriti, que pode ser descrita como a causa primordial do universo.

Existem então dois Deuses – um impessoal Brahman, outro o pessoal lswara? Não – porque Brahman só aparece como lswara quando visto pela relativa ignorância de Maya. lswara possui o mesmo grau de realidade que Maya. Deus, a Pessoa, não é a natureza primordial de Brahman. Nas palavras de Swami Vivekananda, “o Deus Pessoal é a leitura do Impessoal pela mente humana”.

Sri Ramakrishna, que viveu ininterruptamente na consciência do Brahman absoluto, serviu-se da seguinte ilustração: “Brahman. pode ser comparado a um oceano infinito, sem princípio nem fim. Assim como, devido ao frio intenso, algumas partes do oceano se congelam e a água informe parece adquirir forma, do mesmo modo, graças ao intenso amor do devoto, Brahman parece assumir forma e personalidade. Mas a forma toma a desaparecer quando o sol do conhecimento volta a brilhar. Então todo o universo também desaparece e não há senão Brahman, o infinito.”

Muito embora lswara seja, em certo sentido, uma pessoa, deve-mos tomar cuidado para não considerá-lo como semelhante ou idêntico à jiva, a alma humana individual. lswara, como jiva, é Brahman unido a Maya, porém com esta diferença fundamental: lswara é o senhor e controlador de Maya; jiva é o servo e joguete de Maya. Podemos pois dizer, sem paradoxo, que somos ao mesmo tempo Deus e os servos de Deus. Em nossa natureza absoluta, somos unos com Brahman; em nossa natureza relativa, somos diferentes de lswara e estamos sujeitos a Ele.

A devoção a lswara, o Deus Pessoal, pode levar um homem muito longe no caminho da espiritualidade, pode transformá-lo num santo. Mas este não é o conhecimento final. Ser completamente iluminado é ir além de lswara, é conhecer a Realidade Impessoal subjacente à Aparência divina pessoal. Podemos converter- nos em Brahman, já que Brahman sempre está presente em nós. Mas jamais poderemos converter-nos em Iswara, pois lswara está acima da nossa personalidade humana e dela se diferencia. Segue-se, portanto, que nunca nos tornaremos governantes do universo – pois essa é a função de lswara. O desejo de usurpar a função de lswara é a loucura máxima do ego. Na literatura cristã, ela é simbolizada pela lenda da queda de Lúcifer.

Vyasa, o autor dos Brahma Sutras, diz a mesma coisa ao afirmar que ninguém poderá adquirir o poder de criar, governar ou dissolver o universo, já que esse poder pertence unicamente a lswara. E Shankara, em seu comentário, discute o problema da seguinte maneira: “Quando um homem, através da adoração do Brahman qualificado (lswara), alcança o conhecimento do Supremo Governante, preservando ao mesmo tempo sua consciência individual, seu poder é limitado ou ilimitado? A esta pergunta alguns responderão que seu poder é ilimitado, e citarão os textos das escrituras onde se trata daqueles que alcançam o conhecimento de lswara: ‘Eles conquistam o seu próprio reino’, ‘Todos os deuses lhes oferecem adoração’” ‘Seus desejos são realizados em todos os mundos’. Mas Vyasa responde a essa pergunta quando acrescenta: ‘sem o poder de governar o universo’. Todos os outros poderes de lswara podem ser adquiridos pelas almas libertas, mas esse pertence unicamente a lswara. Como sabemos disso? Sabemo-lo porque Ele é protagonista de todos os textos sagrados relativos à criação. Esses textos não fazem a menor referência às almas libertas. Eis por que Ele é chamado ‘o eternamente perfeito’. As escrituras dizem também que os poderes das almas libertas são adquiridos através da adoração e da busca de Deus; portanto, elas não têm lugar no governo do universo. Ainda aqui, visto que as almas libertas preservam sua consciência individual, é possível que suas vontades difiram e que, enquanto uma deseja a criação, outra pode desejar a destruição. A única maneira de evitar esse conflito é subordinar todas as vontades a uma vontade única. Devemos, pois, concluir que as vontades das almas libertas dependem da von-tade do Supremo Governante.”

Se existe uma só consciência, um só Brahman, quem vê e quem é visto? Quem vê Brahman como lswara, e quem é jiva? São eles diferentes ou uma só coisa?

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Enquanto o homem se encontra nas limitações de Maya, o único é visto como muitos. Tudo o que a ignorância pode fazer é adorar a Aparência; e lswara é o governante de todas as aparências – a mais elevada idéia que a mente humana pode apreender e o coração humano amar. A mente humana é incapaz de apreender a Realidade absoluta; tudo o que ela pode fazer é inferir a sua presença e adorar uma imagem projetada. No processo dessa adoração, a mente se purifica, a idéia do ego se dissipa como a névoa, a sobreposição cessa e lswara e a aparência de mundo se desvanecem na chama da consciência transcendental quando o que vê e o que é visto deixam de existir – nada mais existe senão Brahman, o Fato único, universal, atemporal.

O problema do mal

Toda religião ou sistema de filosofia deve tratar do problema do mal – mas, infelizmente, este é um problema que em geral é mais contornado do que explicado. “Por que”, pergunta-se, “Deus permite o mal, se Ele Próprio é só bondade?”

Uma ou duas respostas costumam ser dadas a essa pergunta pelo pensamento religioso ocidental. Às vezes nos dizem que o mal é uma questão educacional e penal. Deus nos castiga pelos nossos pecados visitando-nos com a guerra, a fome, os terremotos, as calamidades e as doenças. Serve-se da tentação (quer diretamente, quer pela intervenção do Demônio) para pôr à prova e fortalecer a virtude dos homens bons. Essa é a resposta dada pelo Antigo Testamento. Na época atual, ela repugna a muitas pessoas e tomou-se antiquada – embora, como veremos logo adiante, contenha um certo grau de verdade, segundo a filosofia do Vedanta.

A outra resposta – hoje mais geralmente aceita – é que o mal não existe em absoluto. Se encararmos a Vida sub specie aeternitatis, veremos que o mal carece de realidade, que ele é simplesmente uma interpretação errônea do bem.

A filosofia Vedanta discorda de ambas as teses – da segunda até mais radicalmente que da primeira. Como, pergunta ela, o mal pode mudar-se em bem pelo simples fato de o considerarmos de uma maneira especial? A dor e o infortúnio podem ser suportados mais facilmente se concentrarmos nossa mente em Deus – mas, não obstante, ambos são experiências muito reais, ainda que sua duração seja limitada. O Vedanta concorda que o mal, no sentido absoluto, é irreal. Mas lembra-nos que, desse ponto de vista, também o bem é irreal. A Realidade absoluta está além do bem e do mal, do prazer e da dor, do sucesso e do insucesso. Tanto o bem quanto o mal são aspectos de Maya. Enquanto Maya existir, eles existirão. No interior de Maya eles são efetivamente reais.

Na verdade, a pergunta “Por que Deus permite o mal?” está erroneamente formulada. É tão absurda como se perguntássemos. “Por que Deus permite o bem?” Ninguém hoje perguntaria por que a chuva “permitiu- uma enchente catastrófica; ninguém acusaria ou louvaria o fogo porque ele queima a casa de um homem e cozinha o jantar de outro. Tampouco se pode dizer apropriadamente que Brahman é “bom” em qualquer sentido pessoal da palavra. Brahman não é “bom” no sentido em que Cristo o era “porque a bondade de Cristo se encontra nos limites de Maya; sua vida expressou a luz da Realidade refletida no mundo relativo. A Realidade em si está além de todos os fenômenos, mesmo o mais nobre. Está além da pureza, da beleza, da felicidade, da glória ou do sucesso. Só podemos descrevê-la como “o bem” se admitirmos que a consciência absoluta é o conhecimento absoluto e que o conhecimento absoluto é a alegria absoluta.

Mas pode ser que a questão não se refira absolutamente a Brahman. Pode ser que, nessa conexão, “Deus” signifique lswara, o Governante de Maya. Isto posto, pode a filosofia Vedanta concordar com a afirmação do Antigo Testamento de que Deus é o doador da lei, um pai severo e algo imprevisível, cujos caminhos não são os nossos, cujos castigos e recompensas parecem quase sempre imerecidos, um pai que permite que caiamos em tentação? A resposta é sim e não. A doutrina Vedanta do Karma é uma doutrina de justiça absoluta, automática. As circunstâncias de nossas vidas, nossas dores e nossos prazeres, são o resultado de nossas ações passadas nesta e em incontáveis existências anteriores, desde o alvorecer dos tempos. De um ponto de vista relativo, Maya é desprovida de piedade.

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Obtemos exatamente aquilo a que fazemos jus, nem mais nem menos. Se bradamos contra uma injustiça aparente, é unicamente porque o ato que a fez recair sobre nós está profundamente sepultado no passado, fora do alcance da nossa memória. Nascer como mendigo, rei, atleta ou como um aleijado irremediável constitui simplesmente as conseqüências compósitas das ações de outras vidas. Não devemos agradecer senão a nós mesmos por elas. Não adianta tentar barganhar com Iswara, ou propiciá-Lo, ou responsabilizá- Lo pelos nossos infortúnios. Não adianta inventar um Demônio como álibi para as nossas fraquezas. Maya é aquilo em que a transformamos – e lswara representa simplesmente o fato inexorável e solene.

De um ponto de vista relativo, este mundo de aparências é um lugar desolado e como tal nos leva muitas vezes ao desespero. Os videntes, com seu conhecimento mais amplo, nos dizem algo bem diverso. Assim que nos conscientizamos, ainda que vagamente, do Atman, nossa Realidade interior, o mundo assume um aspecto muito diferente. Deixa de ser um tribunal para tornar-se unia espécie de academia de ginástica. O bem e o mal, a dor e o prazer continuam a existir, mas assemelham-se mais às cordas, aos cavalos de pau e às paralelas, que podem ser usados para fortalecer nosso corpo. Maya deixa de ser uma roda de dores e prazeres a girar incessantemente para tomar-se uma escada que nos permite ascender à consciência da Realidade. Desse ponto de vista, a ventura e a desventura são ambas “mercês” – vale dizer, oportunidades. Toda experiência nos oferece a oportunidade de reagir construtivamente a ela – reação essa que nos ajuda a quebrar um elo da nossa escravidão a Maya e nos leva para muito mais perto da liberdade espiritual. Assim, Shankara distingue entre dois tipos de Maya – avidya (mal ou ignorância) e vidya (bem). Avidya é aquilo que nos afasta do Eu real e encobre o nosso conhecimento da Verdade. Vidya é aquilo que nos aproxima do Eu real removendo o véu da ignorância. Tanto vidya como avidya são transcendidos quando ultrapassamos Maya e adentramos a consciência da Realidade absoluta.

Já se disse que o princípio de Maya é a sobreposição da idéia do ego ao Atman, ao verdadeiro Eu. A idéia do ego representa uma falsa pretensão à individualidade, a sermos diferentes do nosso próximo. Segue-se, pois, que qualquer ato que contradiga essa pretensão nos fará adiantar um passo rumo ao correto conhecimento, à consciência da Realidade interior. Se reconhecermos a nossa fraternidade com os nossos semelhantes; se tentarmos relacionar-nos com eles sinceramente, verdadeiramente, caridosamente; se, política e economicamente, lutarmos por direitos iguais, por justiça igual e pela abolição das barreiras de raça, classe e credo, então estaremos desmentindo a idéia do ego e caminhando para a percepção da Existência universal, não-individual. Todas essas ações e motivos pertencem àquilo que é conhecido como o bem ético – do mesmo modo que os motivos e ações egoístas pertencem ao mal ético. Nesse sentido, e só nesse sentido, o bem pode ser considerado mais “real”, ou mais válido, do que o mal – já que as más ações e os maus pensamentos nos enredam mais profundamente em Maya, ao passo que as boas ações e os bons pensamentos nos afastam de Maya e nos aproximam da consciência da Realidade.

As palavras “pecado” e “virtude” são de certo modo alheias ao espírito da filosofia Vedanta, porque estimulam necessariamente um sentimento de possessividade com respeito ao pensamento e à ação. Quando dizemos “eu sou bom” ou “eu sou mau”, estamos apenas falando a linguagem de Maya. “Eu sou Brahman” é a única afirmação que qualquer um de nós pode fazer. São Francisco de Sales escreveu que “mesmo o nosso arrependimento deve ser pacífico” – querendo dizer que o remorso excessivo, tal como a autocomplacência excessiva, simplesmente nos vincula mais fortemente à idéia do ego, à mentira de Maya. Nunca devemos esquecer que o comportamento ético é um meio, e não um fim em si mesmo. O conhecimento da Realidade impessoal é o único conhecimento válido. Fora disso, nossa mais profunda sabedoria não passa de negra ignorância e nossa mais estrita retidão é inteiramente vã.

A meta suprema

Pode-se objetar que a filosofia Vedanta, a exemplo de qualquer outro sistema de pensamento religioso, assenta numa hipótese central.

Certamente, a meta suprema da vida é conhecer Brahman – se é que Brahman existe. Mas podemos ter certeza disso? Não é possível que não exista nenhuma realidade subjacente no universo? Não é possível que esta vida não passe de um fluxo desprovido de significação, que morre e se transforma, em perpétua mudança?

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O que mais nos atrai no Vedanta é sua abordagem não-dogmática, seu enfoque experimental da verdade. Shankara não nos diz que devemos aceitar a existência de Brahman como um dogma antes de podermos ingressar na vida espiritual. Não – ele nos convida a descobrirmos por nós mesmos.

Nada – nenhum mestre, nenhuma escritura – pode fazer esse trabalho por nós. Mestres e escrituras são apenas estímulos para o esforço pessoal. Mas, como tais, eles podem ser admiráveis. Imagine que esta é uma ação judicial e que você é o juiz. Procure ouvir imparcialmente as testemunhas de ambos os lados. Considere as testemunhas a favor de Brahman – os videntes e os santos que afirmam ter conhecido a Realidade eterna. Examine suas personalidades, suas palavras, as circunstâncias de suas vidas. Pergunte a si mesmo: esses homens são mentirosos, hipócritas ou insanos, ou estão falando a verdade? Compare as grandes escrituras do mundo e pergunte: elas se contradizem umas às outras ou estão de acordo? Então dê o seu veredicto.

Mas o mero assentimento, como insiste Shankara, não basta. Ele é apenas um passo preliminar em direção à participação ativa na busca. A experiência pessoal direta é a única prova satisfatória da existência de Brahman, e cada um de nós deve tê-la.

A ciência moderna está muito perto de confirmar a visão de mundo Vedanta. Ela admite que a consciência, em variados graus, pode estar presente em toda parte. As diferenças entre objetos e criaturas são meras diferenças de superfície, variadas disposições de átomos. Os elementos podem transformar-se em outros elementos. A identidade é apenas provisória. A ciência ainda não aceita a concepção da Realidade absoluta, mas certamente não a exclui. Shankara nada sabia a respeito da ciência moderna, mas seu método é fundamentalmente científico. Ele se baseia na prática do discernimento – discernimento que deve ser aplicado a nós mesmos e a cada circunstância e objeto de nossa experiência, em cada instante de nossas vidas. Com a maior freqüência possível – milhares e milhares de vezes por dia – devemos perguntar a nós mesmos:

“Isto é real ou irreal, isto é fato ou fantasia, isto é natureza ou mera aparência?” Desse modo nos aprofundaremos cada vez mais na busca da verdade.

Todos nós sabemos que existimos. Todos temos a percepção da nossa própria consciência. Mas qual é a natureza dessa consciência, dessa existência? O discernimento logo nos provará que a idéia do ego não é a realidade fundamental. Existe algo que está além dele. Podemos chamar esse algo de “Brahman”, mas Brahman é apenas mais uma palavra, que não nos revela a natureza daquilo que estamos procurando.

Brahman pode ser conhecido como uma substância ou como algo que existe? Não no sentido comum do verbo. Saber alguma coisa é obter o conhecimento objetivo dela, e esse conhecimento é relativo, dependendo do espaço, do tempo e da causação. Não podemos conhecer a consciência absoluta desse modo, porque a consciência absoluta é o próprio conhecimento. Brahman é a fonte de todos os demais conhecimentos, abrangendo o conhecedor, o conhecimento e a coisa conhecida. É independente do espaço, do tempo e da causa.

Nesse sentido, a prática do discernimento difere do método da pesquisa científica. O cientista se concentra num determinado objeto de conhecimento e examina-o num nível que ultrapassa o campo da percepção sensorial, com a ajuda de aparelhos, da análise química, da matemática e assim por diante. Sua pesquisa se amplia como uma viagem, aprofundando-se cada vez mais no tempo e no espaço. O filósofo religioso procura aniquilar o tempo e o espaço, as dimensões da idéia do ego, a fim de revelar a Realidade que está mais próxima e é mais imediata do que o ego, o corpo ou a mente.

O filósofo religioso procura perceber aquilo que ele é agora e sempre – e essa percepção não é um aspecto da própria consciência. O vidente iluminado não se limita a conhecer Brahman; ele é Brahman; ele é a Existência, ele é o Conhecimento. A liberdade absoluta não é algo que deva ser atingido, o conhecimento absoluto não é algo a ser conquistado, Brahman não é algo que deva ser encontrado. Só Maya deve ser penetrada, só a ignorância deve ser vencida. O processo do discernimento é um processo negativo. O fato positivo, nossa natureza real, existe eternamente. Nós somos Brahman – e só a ignorância nos separa desse conhecimento.

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A consciência transcendental, ou a união com Brahman, nunca poderá ser investigada pelos métodos da pesquisa científica, uma vez que tal pesquisa depende, em última análise, da percepção sensorial, e Brahman está além da percepção dos sentidos. Mas isso não quer dizer que estamos condenados à dúvida – ou a confiar cegamente na experiência dos videntes – enquanto não tivermos atingido pessoalmente a Meta Suprema. Mesmo um pequeno esforço na meditação e na vida espiritual haverá de recompensar-nos com o conhecimento e a convicção de que este é realmente o caminho que leva à verdade e à paz – de que não estamos simplesmente nos enganando ou hipnotizando a nós mesmos -, de que a Realidade está ao nosso alcance. Teremos naturalmente nossos altos e baixos, nossos momentos de incerteza, mas sempre retornaremos a essa convicção. Nenhuma conquista espiritual, por menor que seja, será perdida ou desperdiçada.

Métodos e meios

Existem muitos caminhos conducentes à consciência transcendental. Em sânscrito, esses caminhos são chamados de iogas, ou métodos de união com Brahman. As iogas variam de acordo com o tipo de pessoas. Com efeito, cada indivíduo abordará a Realidade de um modo ligeiramente diferente.

Quatro iogas principais são geralmente reconhecidas na literatura religiosa hindu: Karma, Bhakti, Jnana e Raja. Eis um resumo muito sucinto de suas características:

A Karma Ioga, como o próprio nome indica, está voltada para o trabalho e a ação. Trabalhando altruisticamente pelo nosso próximo, considerando cada ação como uma oferenda sacramental a Deus, cumprindo nosso dever sem ansiedade ou preocupação com o sucesso ou o fracasso, o elogio ou a censura, podemos aniquilar gradualmente a idéia do ego. Através do Karma podemos transcender o Karma e vivenciar a Realidade que está além de qualquer ação.

Bhakti é a Ioga da devoção – devoção a lswara, o Deus pessoal, ou a um grande mestre: Cristo, Buda, Ramakrishna. Graças a essa devoção pessoal, a esse serviço amoroso consagrado a um ideal personificado, o devoto acabará transcendendo completamente sua personalidade. Esta é a ioga do ritual, da adoração, dos sacramentos religiosos. O ritual desempenha aqui um papel importante, o de uma ajuda física, para a concentração – pois os atos do ritual, como os atos da Karma Ioga, evitam que a mente se disperse em suas distrações e ajudam a reconduzi-la firmemente ao seu objeto. Para muitos, este é o caminho más fácil de trilhar.

A Jnana Ioga, por outro lado, é mais adequada para as pessoas cujos intelectos vigorosos e austeros desconfiam do fervor emocional da adoração. Esta é a ioga do puro discernimento. Não requer nenhum Iswara, nenhum altar, nenhuma imagem, nenhum ritual. Visa uma aproximação mais imediata do Brahman Impessoal. Esse caminho pode ser talvez mais direto, mas é também árduo e íngreme e só pode ser palmilhado por poucos.

A Raja Ioga – a ioga da meditação – combina, até certo ponto, as três outras. Não exclui a Karma Ioga e utiliza tanto o método Bhakti quanto o Mana – já que a meditação é uma mistura de devoção e discernimento.

Por temperamento, Shankara propendia para a Jnana Ioga, o caminho do puro discernimento – embora, como este livro irá mostrar, também fosse capaz de grande devoção. Renúncia, discernimento, autocontrole – tais são as suas palavras-chaves. Alguns poderão achar sua austeridade demasiado severa, especialmente na primeira parte do diálogo; mas é precisamente essa austeridade que fornece um valioso corretivo para os perigos de um sentimentalismo fácil, um excesso de otimismo despreocupado, uma confusão da verdadeira devoção com a mera autoconiplacência emocional. Shankara não tinha ilusões quanto a este mundo de Maya; ele condena seus prazeres e deleites aparentes com brutal franqueza. Por isso mesmo era capaz de descrever tão expressivamente a completa transformação do universo que ocorre diante dos olhos do vidente iluminado. Quando se experimenta Brahman, quando todas as criaturas e objetos são vistos na sua verdadeira relação com o Absoluto, então este mundo é realmente um paraíso; ele nada mais é senão Brahman, senão consciência superior, conhecimento e paz. Depois de árduos esforços, o discípulo alcança essa realização no “Supremo Discernimento”, e o livro de Shankara se fecha com a magnificente explosão de sua alegria.

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(Viveka-Chudamani)

III
A Jóia Suprema do Discernimento

Prostro-me diante de Govinda, o mestre perfeito, eternamente absorto no mais elevado estado de bem- aventurança. Sua verdadeira natureza não pode ser conhecida nem pelos sentidos nem pela mente. Ela só é revelada através do conhecimento das escrituras.

A senda

É difícil para qualquer criatura viva realizar o nascimento numa forma humana. A força do corpo e a vontade são ainda mais difíceis de obter; a pureza, mais difícil ainda; mais difícil do que esses bens é o desejo de viver unia vida espiritual; e o mais difícil de tudo é a compreensão das escrituras. Quanto ao discernimento entre o Atman e o não-Atman, à percepção direta do próprio Atman, à união contínua com Brahman e à libertação final – tais coisas só podem ser alcançadas através dos méritos de cem bilhões de encarnações bem-vividas.

Só pela graça de Deus podemos obter esses três raros benefícios: o nascimento humano, a aspiração à libertação e o discipulado junto a um mestre iluminado.

Há, porém, aqueles que de algum modo conseguem obter esse raro nascimento humano junto com a força corporal e mental e com a compreensão das escrituras – e não obstante estão de tal forma iludidos que não lutam pela libertação. Esses homens são suicidas. Apegam-se ao irreal e destroem a si mesmos.

Pois haverá maior tolo do que o homem que obteve esse raro nascimento humano junto com a força corporal e mental e ainda assim não consegue, devido à ilusão, realizar o seu bem supremo?

Os homens podem recitar as escrituras e oferecer sacrifícios aos espíritos sagrados, podem executar rituais e adorar as divindades mas, enquanto não despertarem para o conhecimento de sua identidade com o Atman, jamais atingirão a libertação; não, nem mesmo ao cabo de muitas centenas de séculos.

As escrituras declaram que a imortalidade não pode ser conquistada através do trabalho, nem da progênie, nem da riqueza, mas unicamente pela renúncia. Assim, fica claro que o trabalho não nos pode trazer a libertação.

Que o sábio, pois, renuncie à busca do prazer nas coisas exteriores e lute arduamente pela libertação. Que procure um mestre nobre e de alma elevada e se absorva de todo o coração na verdade que lhe é ensinada.

Pela devoção ao reto discernimento ele ascenderá à suprema união com Brahman. Pelo poder do Atman ele salvará a sua alma, que jaz imersa nas vastas águas do mundo.

Deixa que o sábio, que cresceu tranqüilo e que pratica a contemplação do Atman, se desligue de todas as atividades mundanas e se esforce para cortar os vínculos com o mundanismo.

A ação reta ajuda a purificar o coração, mas não nos dá a percepção direta da Realidade. A Realidade é atingida por meio do discernimento, mas não, nem no mais ínfimo grau, através de dez milhões de atos.

O discernimento correto revela-nos a verdadeira natureza de uma corda e remove o doloroso medo ocasionado pela nossa crença ilusória de ser ela uma enorme cobra.

Um certo conhecimento da Realidade só pode ser obtido através da meditação sobre o ensinamento correto, e não por meio de abluções sagradas, ou de esmolas, ou da prática de centenas de exercícios respiratórios.

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O êxito em alcançar a meta depende sobretudo das qualificações daquele que busca. Tempo e lugar adequados e outras circunstâncias favoráveis constituem outras tantas ajudas para se atingir a meta.

Que aquele, pois, que deseja conhecer o Atman, que é a Realidade, pratique o discernimento. Mas antes deve aproximar-se de um mestre que seja um perfeito conhecedor de Brahman e cuja compaixão seja tão vasta como o próprio oceano.

O discípulo

O homem deve ser inteligente e sábio, com grande poder de compreensão e capaz de superar as dúvidas pelo exercício da razão. Quem possui essas qualificações está apto a adquirir o conhecimento do Atman.

Só pode ser considerado qualificado para buscar Brahman. o homem dotado de discernimento, cuja mente esteja afastada de todos os prazeres, o homem que possui a tranqüilidade e as virtudes afins e que aspira ardentemente à libertação.

Neste contexto, os sábios falaram de quatro qualificações que permitem alcançar a meta. Quando essas qualificações estiverem presentes, a devoção à Realidade se tomará completa. Se estiverem ausentes, ela fracassará.

A primeira é o discernimento entre o eterno e o não-eterno. Segue-se a renúncia ao gozo dos frutos da ação, nesta e na outra vida. Em seguida vêm os seis tesouros da virtude, a começar pela tranqüilidade. E, enfim, o anseio de libertação.

Brahman é real; o universo é irreal. A firme convicção dessa verdade denomina-se discernimento entre o eterno e o não-eterno.

A renúncia é o abandono de todos os prazeres dos olhos, dos ouvidos e dos demais sentidos, o abandono de todos os objetos de prazer transitório, o abandono do desejo de um corpo físico, assim como do tipo supremo de corpo-espírito de um deus.

Afastar a mente de todas as coisas objetivas mediante um contínuo discernimento de sua imperfeição e dirigi-Ia resolutamente para Brahman, sua meta – a isto se chama tranqüilidade.

Afastar os dois tipos de órgãos sensoriais – os da percepção e os da ação – das coisas objetivas e deixá-los repousar em seus respectivos centros – a isto se chama autocontrole. O verdadeiro equilíbrio mental consiste em não permitir que a mente reaja aos estímulos externos.

Suportar todos os tipos de aflição sem revolta, sem queixa ou lamento – a isto se chama paciência.

Uma firme convicção, baseada na compreensão intelectual, de que os ensinamentos das escrituras e de um mestre são verdadeiros – a isto os sábios chamam de fé, que leva à realização da Realidade.

Concentrar o intelecto repetidamente no puro Brahman e mantê-lo sempre fixado em Brahman – a isto se chama submissão. O que não significa aquietar a mente, como a um bebê, com pensamentos ociosos.

O anseio de libertação é a vontade de libertar-nos dos grilhões forjados pela ignorância – começando com o sentimento do ego e assim por diante, indo até o próprio corpo físico – mediante a compreensão da nossa verdadeira natureza.

Embora esse anseio de libertação possa estar presente num grau leve e moderado, ele se intensificará através dos méritos do mestre e da prática da renúncia e de virtudes como a tranqüilidade, etc. E dará os seus frutos.

Quando a renúncia e o anseio de libertação se acham presentes num grau intenso, a prática da tranqüilidade e das demais virtudes frutificará e conduzirá à meta.

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Quando a renúncia e o anseio de libertação são fracos, a tranqüilidade e as demais virtudes constituem mera aparência, qual miragem no deserto.

Dentre os meios de libertação, a devoção é suprema. Empenhar-nos sinceramente em conhecer a nossa verdadeira natureza – a isso se chama devoção.

Em outras palavras, a devoção pode ser definida como a busca da realidade do nosso próprio Atman. Aquele que busca a realidade do Atman, que possui as qualificações acima mencionadas, deve procurar um mestre iluminado capaz de ensinar-lhe o caminho da libertação em relação a todos os tipos de servidão.

O mestre

O Mestre é um homem profundamente versado nas escrituras, puro, livre da luxúria, perfeito conhecedor de Brahman. Mantém-se continuamente apoiado em Brahman, é calmo como a chama cujo combustível vai sendo consumido, um oceano de amor que não conhece motivos ulteriores, um amigo de todas as pessoas bondosas que humildemente se confiam à sua direção.

O homem que busca há de aproximar-se do mestre com reverente devoção. Então, depois de agradar-lhe pela sua humildade, amor e serviço, perguntará tudo o que pode ser conhecido a respeito do Atman.

Ó Mestre, amigo de todos os devotos, curvo-me diante de vós. Ó ilimitada compaixão, eu caí no mar do mundo – salvai-me com esses olhos inalteráveis que derramam graça sempiterna, como néctar.

Estou ardendo no incêndio da floresta do mundo, incêndio que ninguém pode apagar. As más ações do passado impelem-me daqui para ali como vastos vendavais. Busquei refúgio em vós. Salvai-me da morte. Não conheço outro abrigo.

Existem almas puras que alcançaram a paz e a magnanimidade. Elas trazem o bem à humanidade, como o repontar da primavera. Também elas atravessaram o terrível oceano deste mundo. E agora, sem nenhum motivo egoísta, ajudam os outros a fazer a travessia.

É próprio dessas grandes almas trabalhar espontaneamente para aliviar as atribulações de seus semelhantes, tal como a lua refresca espontaneamente a terra crestada pelos candentes raios do sol.

A nau dos vossos lábios mergulhou na bem-aventurança de Brahman e impregnou-se da sua doçura. Derramai sobre mim, como gotas de néctar, as palavras de Brahman. Elas purificam, acalmam e são aprazíveis ao ouvido. Senhor, o calor ardente desta vida mundana me consome como as labaredas de um incêndio na floresta. Bem-aventurado aquele sobre quem vossos olhos repousam um instante que seja – é assim que os aceitais e deles vos apropriais.

Como hei de atravessar o oceano deste mundo? Qual há de ser a minha meta? Que caminho hei de seguir? Não conheço nenhum. Sede generoso, Senhor. Salvai-me. Dizei-me como pôr termo às misérias desta vida terrena. Nada recuseis.

Crestado pelas ardentes labaredas da floresta do mundo, o discípulo pronuncia essas palavras. A grande alma olha para o discípulo que assim busca refúgio e seus olhos estão úmidos de lágrimas de misericórdia. Imediatamente, ele liberta o discípulo de seus temores.

O discípulo, que buscou sua proteção, é alguém que anseia pela libertação, que cumpriu rigorosamente seus deveres, cujo coração se fez tranqüilo e que alcançou a serenidade da mente. Com compaixão, o homem sábio e santo começa a instruí-lo na verdade.

Ó homem prudente, não temas! Não corres nenhum risco. Existe um meio de atravessar o oceano da vida mundana. Vou revelar-te o método pelo qual os sábios chegaram à outra margem.

Existe um método eficaz de pôr termo ao horror desta vida mundana. Por ele poderás atravessar o oceano do mundo e alcançar a suprema bem-aventurança.

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Meditar sobre o significado da verdade, tal como a ensinam os Vedantas, conduz à suprema iluminação. Por esse meio, a miséria da vida mundana é totalmente destruída.

Fé, devoção e união constante com Deus através da oração – estas qualidades são declaradas pelas sagradas escrituras como o meio direto de libertação para aquele que busca. Àquele que nelas persiste, advém a libertação do estado de servidão da consciência física que foi forjado pela ignorância.

Por estares associado com a ignorância, o supremo A~ que em ti reside parece estar subjugado pelo não- Atman. Essa é a única causa do ciclo de nascimentos e mortes. A chama da iluminação, que se acende pelo discernimento entre Atman e não-Atman, consumirá os efeitos da ignorância até suas próprias raízes.

As perguntas

Fala o Discípulo:

Mestre, ouvi as perguntas que vou fazer. Bem-aventurado serei se puder ouvir uma resposta de vossos lábios.

O que é, na realidade, essa servidão? Como ela começou? Em que se enraíza? Como é o homem que dela se libertou? O que é o não-Atman? Que é o supremo Atman? Como discernir entre eles? Por favor, respondei-me.

Fala o Mestre:

Bem-aventurado és, de fato! Estás perto da meta. Graças a ti, toda a tua família se purificou, porque anseias por libertar-te da servidão da ignorância e alcançar Brahman.

Os filhos podem libertar os pais de suas dívidas, mas nenhuma outra pessoa pode libertar um homem de sua servidão: ele próprio deve fazê-lo.

Outros podem aliviar o sofrimento causado por um fardo que pesa sobre a nossa cabeça; mas o sofrimento que deriva da fome, etc., só pode ser aliviado por nós mesmos.

O homem doente que toma remédio e observa as regras da dieta pode recuperar a saúde – mas não através dos esforços de outrem.

Uma clara visão da Realidade só pode ser obtida através de nossos próprios olhos, quando eles se abrirem por meio do discernimento espiritual – mas nunca através dos olhos de outro vidente. Por nossos próprios olhos aprendemos a ver a aparência da lua: como poderíamos aprender isso pelos olhos de outrem?

As cordas que, devido à nossa ignorância, nos amarram aos nossos desejos lascivos e aos frutos do nosso Karma – como poderia alguém a não ser nós próprios desatá-las, mesmo no curso de inumeráveis séculos?

Nem pela prática da ioga ou da filosofia Sankhya, nem pelas boas obras, nem pelo saber nos chega a libertação, mas unicamente pela compreensão de que Atman e Brahman são um – e de nenhuma outra maneira.

É dever de um rei contentar o seu povo, mas nem todos os que contentam o povo são aptos a ser reis. Porque o povo pode ser contentado pela beleza da forma de uma vina e pela habilidade com que suas cordas são tocadas.

A erudição, o discurso bem-articulado, a riqueza de vocabulário e a capacidade de interpretar as escrituras – tais coisas aprazem ao erudito, mas não trazem a libertação.

O estudo das escrituras será vão enquanto Brahman não tiver sido experimentado. E, depois que Brahman foi experimentado, é inútil ler as escrituras.

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Uma rede de palavras é como uma floresta densa que obriga a mente a perambular de lá para cá. Aqueles, pois, que conhecem esta verdade devem trabalhar arduamente para vivenciar Brahman.

Quando um homem foi mordido pela cobra da ignorância, ele só pode ser curado pela realização de Brahman. De que servem os Vedas e as escrituras, os amuletos e as ervas?

Não se cura uma doença pronunciando a palavra “remédio”. É preciso tomar o remédio. A libertação não vem com o mero fato de pronunciar a palavra “Brahman”. Brahman deve ser realmente vivenciado.

Enquanto não permitirmos que este universo aparente desapareça da nossa consciência, enquanto não experimentarmos Brahman, como podemos encontrar a libertação pela simples pronúncia da palavra “Brahman”? O resultado é um mero ruído.

Enquanto não tiver destruído seus inimigos e tomado posse do esplendor e das riquezas do reino, o homem não pode tomar-se rei dizendo simplesmente: “Eu sou um rei.”

Um tesouro enterrado não pode ser descoberto apenas pronunciando-se a palavra “apareça”. É preciso seguir as indicações corre-tas, cavar, remover as pedras e a terra que o recobrem e então apropriar-se dele. Do mesmo modo, a pura verdade do Atman, que está enterrada sob Maya e sob os efeitos de Maya, só pode ser alcançada pela meditação, pela contemplação e por outras disciplinas que o conhecedor de Brahman pode prescrever – nunca, porém, por meio de argumentos sutis.

Deve o sábio, pois, exercer todos os seus poderes para obter a libertação da servidão do mundo da mesma forma que tomaria os remédios prescritos contra as doenças físicas.

A pergunta que hoje formulaste é muito oportuna. Ela é relevante para os ensinamentos das escrituras. Seu significado está oculto nas profundezas, como no âmago de um aforismo. Todos aqueles que buscam a libertação devem fazê-la.

Ouve atentamente, ó homem prudente, o que tenho a dizer. Se ouvires, serás decerto libertado dos grilhões do mundo.

Dos passos que conduzem à libertação, o primeiro é o completo desprendimento de todas as coisas não- eternas. Em seguida, vem a prática da tranqüilidade, do autocontrole e da paciência. E depois a completa renúncia a todas as ações inspiradas pelo desejo pessoal, egoísta.

Então o discípulo deve ouvir a verdade do Atman e refletir a respeito dela, e meditar sobre ela constantemente, ininterruptamente, durante longo tempo. Assim, o sábio alcança o estado supremo no qual a consciência do sujeito e do objeto se dissolve e só a infinita consciência da unidade permanece – e então ele conhece a bem-aventurança do Nirvana enquanto ainda vive neste mundo.

Atman e não-Atman

Explicarei agora o discernimento entre o Atman e o não-Atman. Ouve-me, pois. Ouve atentamente e depois compreende a respectiva verdade em tua própria alma.

O que o vidente chama de corpo material compõe-se destas substâncias: tutano, osso, gordura, carne, sangue, pele e epiderme. Esse corpo consiste em pernas, coxas, peito, braços, pés, costas, cabeça e outras partes. Sabe-se que ele é a raiz da ilusão do “eu” e do “meu”.

Os elementos sutis são o éter, o ar, o fogo, a água e a terra. Reunidas, as partes desses elementos formam o corpo material.

Audição, tato, visão, paladar e olfato – estas cinco essências dos elementos são tudo o que experimentamos. Elas existem para serem experimentadas pelo indivíduo.

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Os seres iludidos que estão atados aos objetos que experimentam pela forte corda do desejo, tão difícil de romper, permanecem sujeitos ao nascimento e à morte. São impelidos de lá para cá pelo seu próprio karma, essa lei implacável.

O cervo, o elefante, a mariposa, o peixe a abelha – cada um desses animais caminha para a morte sob o fascínio de apenas um dos cinco sentidos. Qual não há de ser, então, o destino que aguarda o homem subjugado pelo fascínio dos cinco sentidos?

Os objetos percebidos pelos sentidos são ainda mais fortes em seus efeitos maléficos do que o veneno da cobra. O veneno só mata quando é introduzido no corpo, mas esses objetos nos destroem pelo simples fato de serem vistos com os olhos.

Só aquele que se libertou da terrível armadilha do anseio de prazeres sensoriais, aos quais é tão difícil renunciar, está apto à libertação – e ninguém mais, ainda que seja versado nos seis sistemas de filosofia.

Aqueles que dizem buscar a libertação mas não possuem o verdadeiro espírito de renúncia tentam, ainda assim, atravessar o oceano deste mundo. O tubarão do desejo apanha-os pela garganta, desvia-os violentamente de sua rota e eles se afogam a meio caminho.

Aquele que matou o tubarão do desejo sensorial com a espada da verdadeira impassibilidade atravessa o oceano deste mundo sem deparar com nenhum obstáculo.

Saiba que o homem iludido, que caminha pela terrível senda do desejo sensorial, aproxima-se a cada passo de sua ruína. E saiba também que é verdade – que aquele que trilha o caminho indicado pelo seu mestre – seu amigo mais leal – e pelo seu próprio discernimento colhe o fruto supremo do conhecimento de Brahman.

Se almejas realmente a libertação, mantém os objetos do gozo sensorial à distância, como um veneno, e continua bebendo com deleite, como um néctar, as virtudes do contentamento, da compaixão, do perdão, da sinceridade, da serenidade e do autocontrole.

O homem deve estar continuamente empenhado em libertar-se da servidão da ignorância, que não tem começo. Aquele que negligencia esse dever e está apaixonadamente empenhado em alimentar os desejos do corpo comete um suicídio. Porque o corpo é apenas um veículo de experiência para o espírito humano.

Aquele que procura encontrar o Atman alimentando os desejos do corpo está tentando atravessar um rio agarrado a um crocodilo, confundindo-o com uma tábua.

O apego ao corpo, aos objetos e às pessoas é fatal para aquele que busca a libertação. Quem superou completamente o apego está pronto para alcançar o estado de libertação.

Mata esse implacável apego ao corpo, à esposa, aos filhos e aos outros. Os videntes que o superaram adentram a suprema morada de Vishnu, aquele que a tudo impregna.

Esse corpo que é feito de pele, carne, sangue, artérias, veias, gordura, tutano e osso está cheio de matéria residual e de imundície, e merece o nosso desprezo.

Vigília, sono, sono sem sonhos

Este corpo físico é composto dos elementos materiais, que são formados pelo composto quíntuplo de seus elementos sutis. Ele nasceu através do karma da vida anterior e é o veículo da experiência para o Atman. Quando o universo objetivo está sendo percebido, isso é conhecido como o estado de vigília da consciência.

No estado de vigília da consciência, o homem encontra sua plena atividade no corpo. Nesse estado ele se identifica com seu corpo, embora esteja efetivamente separado dele. Por meio dos sentidos externos ele desfruta os objetos materiais, como grinaldas, perfumes, mulheres e assim por diante, bem como outros objetos que proporcionam prazer sensorial.

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Deves saber que esse corpo, por meio do qual o homem experimenta o mundo exterior, é como a casa de um chefe de família.

As características inerentes a esse corpo material são o nascimento, o declínio e a morte. Ele está sujeito a variadas condições, como a gordura ou a magreza; e a vários estágios de desenvolvimento, como a infância e a juventude. É controlado pelos preceitos de casta e pelos preceitos das quatro ordens da vida. Está sujeito a várias doenças e a diferentes tipos de tratamento, como a adoração, a afronta ou o respeito.

Seus órgãos de percepção são os ouvidos, a pele, os olhos, o nariz e a língua: por eles conhecemos os objetos.

Seus órgãos de ação são os órgãos vocais, as mãos, as pernas e os órgãos de excreção e reprodução. Esses órgãos nos envolvem na ação.

O órgão mental compreende a mente, o intelecto, o ego e a natureza emocional. Estes se distinguem pelas suas diferentes funções. A função da mente é examinar os vários aspectos de um objeto. A função do intelecto é determinar a verdadeira natureza de um objeto.

O ego é a autoconsciência que surge quando o órgão mental se identifica com o corpo. A tendência da natureza emocional é atrair-nos para aquilo que é agradável.

A força vital se divide de acordo com suas cinco diferentes funções. A -respiração- é a função da força vital utilizada na respiração. A “respiração descendente” é usada na excreção. A “respiração distributiva” controla os processos da digestão e da assimilação. A “respiração difusa” está presente em todo o corpo, resistindo à desintegração e unindo-o em todas as suas partes. A “respiração ascendente” é usada na eructação. Assim como o ouro é conhecido por diferentes nomes quando é moldado para diversos ornamentos, assim como a água assume a forma de ondas, espuma, etc., também a força vital única recebe esses cinco nomes diferentes segundo suas cinco diferentes funções.

Oito grupos compõem o corpo sutil: cinco órgãos de percepção, cinco órgãos de ação, cinco funções da força vital, cinco elementos sutis e o órgão mental, junto com a ignorância, os desejos e o karma.

O corpo sutil é composto pelos elementos sutis antes que eles entrem em seus compostos quíntuplos. É a sede de nossos desejos. É o campo no qual os frutos do karma são experimentados. Devido à ignorância humana, esse corpo sutil foi sobreposto ao Atman desde um tempo sem princípio.

O estado de sonho pertence eminentemente ao corpo sutil. Durante os sonhos, ele cria a sua própria matéria e brilha com a sua própria luz. O órgão mental é um depósito das numerosas impressões deixadas pelos desejos que experimentamos no estado de vigília. Nos sonhos, o órgão mental se identifica com a consciência do ego e está à mercê dessas impressões. Porém o Atman permanece além, como sempre, em sua própria consciência auto-iluminada. Durante esse tempo, o órgão mental é o seu único invólucro. O Atman testemunha tudo, mas não se deixa contaminar por nossas experiências oníricas, mantendo-se eternamente livre e intacto. Nenhum karma criado pelos corpos que o recobrem pode contaminá-lo, ainda que no mais ínfimo grau.

O corpo sutil é como unia ferramenta afiada na mão do carpinteiro. Ele é o instrumento de toda a atividade do Atman, que é infinita sabedoria. Portanto, o próprio Atman está livre de qualquer mácula.

As condições de cegueira, fraqueza e visão aguçada pertencem aos olhos e são causadas pelas suas qualidades e defeitos. Do mesmo modo, a surdez e a mudez são condições dos ouvidos e da língua – mas não do Atman, o conhecedor.

A inalação, a exalação, o bocejo, o espirro, a descarga de saliva e o abandono do corpo por ocasião da morte são considerados, por aqueles que sabem, como as várias funções da força vital. A fome e a sede são também funções da força vital.

O órgão mental identifica-se com os órgãos da percepção e da ação, assim como com o corpo físico. Desse modo, surge o sentimento de individualidade, que leva o homem a viver e a agir. Sua consciência é um reflexo da infinita consciência do Atman.

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Aquele que acredita que está agindo ou experimentando é reconhecido como o ego, o homem individual. Identificando-se com as gunas, ele passa pelos três estados de consciência – a vigília, o sonho e o sono sem sonhos.

Quando os objetos da experiência são agradáveis, ele é feliz. Quando são desagradáveis, é infeliz. O prazer e a dor são característicos do indivíduo, e não do Atman, que é sempre bem-aventurado.

O objeto da experiência é digno de amor – não por si mesmo, mas porque serve ao Atman. Porém o próprio Atman deve ser amado acima de todas as coisas.

No sono sem sonhos, quando não há nenhum objeto de experiência, sente-se a alegria do Atman. Isso é confirmado pela nossa própria experiência, assim como pelas escrituras, pela tradição e pela lógica.

Maya

Maya, no seu aspecto virtual, é o poder divino de Deus. Não tem começo. Composta por três gunas, é sutil e está além da percepção. É dos efeitos que ela produz que sua existência é inferida pelo sábio. É ela que dá origem a todo o universo.

Não é nem um ser nem um não-ser, nem uma mistura de ambos. Não é nem divisível nem indivisível, nem uma mistura de ambos. Não é nem um todo indivisível nem uma soma de partes, nem uma mistura de ambos. É estranhíssima. Sua natureza é inexplicável.

Assim como a percepção de que uma corda é uma corda destrói a ilusão de ser ela uma cobra, também Maya é destruída pela experiência direta de Brahman – o puro, o livre, o primeiro sem um segundo. Maya é composta pelas gunas – as forças conhecidas como rajas, tamas e sattwa. Essas forças têm características distintas.

Rajas tem o poder de projeção: sua natureza é a atividade. Graças a esse poder, o mundo fenomenal, que está envolvido em Maya, começa a evoluir. O apego, o desejo e outras qualidades semelhantes são causadas por seu poder, assim como a tristeza e outras disposições da mente.

A luxúria, a cólera, a cobiça, a arrogância, o ciúme, o egotismo, a inveja e outros vícios similares são as piores características de rajas. Quando um homem é dominado por ela, fica apegado às ações mundanas. Por isso rajas é a causa da servidão.

Tamas tem o poder de encobrir a verdadeira natureza de um objeto, fazendo-o parecer diferente do que é. É a causa da contínua sujeição do homem à roda de nascimento e morte. Além disso, é ela que torna possível a operação do poder de rajas.

Um homem pode ser inteligente, talentoso e culto. Pode ter a faculdade da auto-análise perspicaz. Mas, se for dominado por tamas, não poderá compreender a verdadeira natureza do Atman, ainda que ela lhe seja claramente explicada de várias maneiras. Ele toma a aparência, que é o produto de sua ignorância, pela realidade – e com isso se apega às ilusões. Infelizmente, esse obscuro poder da terrível tamas é muito grande.

Incapacidade de perceber o objeto real, ver algo como diferente do que ele de fato é, vacilação da mente, tomar as ilusões por realidades – tais são as características de tamas. Enquanto estiver apegado a tamas, o homem nunca se libertará delas. E também rajas irá perturbá-lo incessantemente.

Tamas tem mais estas características: ignorância, preguiça, entorpecimento, sono, ilusão e estupidez. O homem que se encontra sob a influência dessas características não consegue compreender coisa alguma. Vive como um sonâmbulo ou como uma tora inconsciente.

Sattwa é pureza. Mesmo quando está misturada com rajas e tamas, como água misturada com água, ilumina o caminho da libertação. Sattwa revela o Atman tal como o sol revela o mundo objetivo.

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Sattwa, quando misturada com as outras gunas, tem estas características: ausência de orgulho, pureza, contentamento, austeridade, desejo de estudar as escrituras, submissão a Deus, inocência, veracidade, continência, ausência de cobiça, fé, devoção, anseio de libertação, aversão às coisas deste mundo, e as demais virtudes que levam a Deus.

Sattwa no seu estado puro tem as seguintes características: serenidade, percepção direta do Atman, paz absoluta, contentamento, alegria e constante devoção ao Atman. Graças a essas qualidades, o homem que busca goza de eterna beatitude.

Maya foi definida como um composto das três gunas. É o corpo causal do Atman. O sono sem sonhos pertence eminentemente ao corpo causal. Nesse estado, as atividades da mente e dos órgãos sensoriais estão suspensas.

No sono sem sonhos não há nenhum tipo de cognição. Porém a mente continua a existir na sua forma sutil, como unia semente. A prova disso pode ser encontrada na experiência de todo indivíduo -ao acordar, a mente ainda se lembra: “Não percebi nada.”

Existem o corpo, os órgãos sensoriais, a força vital, a mente, o ego e suas funções, os objetos de gozo, os prazeres e todos os outros tipos de experiência, os elementos densos e os sutis – em suma, todo o universo objetivo e Maya, que é a sua causa. Nada disso é Atman.

Deves saber que Maya e todos os seus efeitos – do intelecto cósmico ao corpo denso – não são o Atman. São todos irreais, qual miragem no deserto.

O Atman

Agora vou explicar-te a natureza do Atman. Se a compreenderes, estarás livre dos grilhões da ignorância e alcançarás a libertação.

Há uma Realidade que existe por si mesma e que constitui a base da nossa consciência do ego. Essa Realidade é a testemunha dos três estados da nossa consciência e difere dos cinco invólucros corporais.

Essa Realidade é o conhecedor em todos os estados de consciência – vigília, sonho e sono sem sonhos. Ela está cônscia da presença ou da ausência da mente e suas funções. É o Atman.

A Realidade vê tudo pela sua própria luz. Ninguém pode vê-Ia. Ela dá inteligência à mente e ao intelecto, mas ninguém lhe dá luz.

A Realidade permeia o universo, mas ninguém pode penetrá-la. Ela brilha por si mesma. O universo brilha com o reflexo da Sua luz.

Graças à Sua presença, o corpo, os sentidos, a mente e o intelecto se aplicam às suas respectivas funções, como se obedecessem ao Seu comando.

Sua natureza é a eterna consciência. Ela conhece todas as coisas, da consciência do ego ao próprio corpo. É o conhecedor do prazer e da dor e dos objetos dos sentidos. Conhece tudo objetivamente – tal como um homem conhece a existência objetiva de um jarro.

Essa Realidade é o Atman, o Ser Supremo, o imemorial, que nunca cessa de sentir infinita alegria. Ele é sempre o mesmo. É a própria consciência. Os órgãos e as energias vitais funcionam sob o seu comando.

Aqui, dentro deste corpo, na mente pura, na câmara secreta da inteligência, no universo infinito do coração, o Atman reflete no seu esplendor fascinante, como o sol do meio-dia. Pela sua luz o universo é revelado.

Ele é o conhecedor das atividades da mente e do homem individual. É a testemunha de todas as ações do corpo, dos órgãos sensoriais e da energia vital. Parece identificar-se com todos estes, tal como o fogo parece identificar-se com uma esfera de ferro, mas não age nem está sujeito à mais ligeira mudança.

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O Atman não conhece o nascimento nem morte. Não evolui nem declina. É imutável, eterno. Não se dissolve quando o corpo se dissolve. Deixará o éter de existir quando se quebra o recipiente que o contém?

O Atman é distinto de Maya, a causa primeira, e de seu efeito, o universo. A natureza do Atman é a pura consciência. O Atman reve-la todo este universo da mente e da matéria. Não se pode defini-lo. Dentro e através dos vários estados de consciência – a vigília, o sonho e o sono – ele mantém nossa ininterrupta consciência de identidade, manifestando-se como a testemunha da inteligência.

A mente

Com uma mente disciplinada e um intelecto que alcançou a pureza e a serenidade, deves conhecer o Atman diretamente, no teu íntimo. Reconhece o Atman como o Eu real. Desse modo atravessarás o oceano ilimitado da mundanidade, cujas ondas são o nascimento e a morte. Vive sempre no conhecimento da identidade com Brahman * sê bem-aventurado.

O homem está em servidão porque confunde o não-Atman com o seu verdadeiro Eu. Isto é causado pela ignorância. Daí decorre a miséria do nascimento e da morte. Pela ignorância o homem identifica o Atman com o corpo, tomando o perecível pelo real. Por isso ele alimenta esse corpo, unge-o e o protege cuidadosamente. Enreda-o nas coisas dos sentidos como uma lagarta nos fios do seu casulo.

Iludido pela sua ignorância, o homem confunde uma coisa com outra. A falta de discernimento levará o homem a pensar que uma cobra é unia corda. Se a apanhar com essa crença, correrá grande risco. A aceitação do irreal como real constitui o estado de servidão. Presta atenção a isso, amigo.

O Atman é indivisível, eterno, o primeiro sem um segundo. Manifesta-se eternamente pelo poder do seu próprio conhecimento. Suas glórias são infinitas. O véu de tamas encobre a verdadeira natureza do Atman, tal como um eclipse encobre os raios do sol.

Quando os puros raios do Atman estão assim encobertos, o homem iludido se identifica com o seu corpo, que é não-Atman. Então rajas, que tem o poder de projetar formas ilusórias, aflige-o dolorosamente. Acorrenta-o com os grilhões da luxúria, da cólera e das demais paixões.

Sua mente toma-se pervertida. Sua consciência do Atman é devorada pelo tubarão da total ignorância. Submetendo-se ao poder de rajas, ele se identifica com os numerosos movimentos e mudanças da mente e assim é arrastado de lá para cá, ora aflorando, ora afundando no oceano ilimitado do nascimento e da morte, cujas, águas estão cheias do veneno dos objetos sensoriais. Este é um destino realmente miserável.

Os raios do sol produzem camadas de nuvem. Por elas o sol é encoberto, e então parece que só as nuvens existem. Do mesmo modo, o ego, produzido pelo Atman, encobre a verdadeira natureza do Atman, e então parece que só o ego existe.

Num dia tempestuoso o sol é encoberto por espessas nuvens, e essas nuvens são fustigadas por violentas e gélidas rajadas de vento. Do mesmo modo, quando o Atman é envolvido pelas espessas trevas de ta7ms, o terrível poder de rajas fustiga o homem iludido com todos os tipos de aflições.

A servidão do homem é provocada pelo poder de tamas e rajas. Iludido por ela, o homem toma o corpo pelo Atman e extravia-se no caminho que leva à morte e ao renascimento.

A vida do homem neste mundo relativo pode ser comparada a uma árvore. Tamas é a semente. A identificação do Atman com o corpo, o seu crescimento. Os desejos são as folhas. O trabalho é a seiva. O corpo, o tronco. As forças vitais são os galhos. Os órgãos sensoriais, os rebentos. Os objetos dos sentidos, as flores. Os frutos, os sofrimentos causados por várias ações. O homem individual é o pássaro que come os frutos da árvore da vida.

A sujeição do Atman ao não-Atman provém da ignorância. Não tem uma causa externa. Não tendo princípio, perdurará indefinidamente enquanto o homem não alcançar a iluminação. Enquanto o homem permanecer nessa servidão, ela o sujeitará a um longo cortejo de misérias – nascimento, morte, doença, decrepitude e assim por diante.

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Essa servidão não pode ser vencida nem pelas armas, nem pelo vento, nem pelo fogo, nem por milhões de atos. SÓ a espada cortante do conhecimento pode extirpá-la. Esta é forjada pelo discernimento e aguçada pela pureza do coração mediante a graça divina.

O homem deve cumprir com fidelidade e devoção os deveres prescritos pelas escrituras. Isso lhe purifica o coração. O homem de coração puro realiza o supremo Atman. Desse modo, ele destrói sua servidão ao mundo, arrancando-a pela raiz.

Envolto em seus cinco invólucros, a começar pelo corpo físico, que são os produtos de sua própria Maya, o Atman permanece oculto, tal como a água de um lago é recoberta por um véu de espuma.

Quando se remove a espuma, a água pura é vista claramente. Ela sacia a sede do homem, refresca-o imediatamente e torna-o feliz.

Quando se removem todos os cinco invólucros, o puro Atman é revelado como o Deus que habita em nosso íntimo, como infinita e genuína bem-aventurança, como o Ente supremo e auto-iluminado.

O sábio que busca libertar-se da servidão há de discernir entre Atman e não-Atman. SÓ assim ele pode compreender o Atman, que é o Ser Infinito, a Sabedoria Infinita e o Amor Infinito. SÓ assim ele encontra a felicidade.

O Atman habita em nosso íntimo, livre do apego e para além de toda ação. O homem deve separar esse Atman de todo objeto da experiência, tal como uma haste de erva é separada de seu invólucro. Então ele deve dissolver no Atman todas as aparências que constituem o mundo do nome e da forma. Livre é a alma que assim pode permanecer no Atman.

O corpo

Este corpo é um “invólucro físico”. O alimento possibilita o seu nascimento; com alimento ele vive; sem alimento, ele morre. Esse corpo consiste em epiderme, pele, carne, sangue, ossos e água. Não pode ser o Atman, o eternamente puro, o que existe por si só.

Ele não existia antes do nascimento e não existirá depois da morte. Existe apenas por um breve lapso de tempo, no intervalo entre ambos. Sua natureza é transitória e sujeita a mudança. Ele é um composto, e não um elemento. Sua vitalidade é um simples reflexo. É um objeto sensorial, que pode ser percebido como um jarro. Como há de ser ele o Atman, o experimentador de todas as experiências?

O corpo consiste em braços, pernas e outros membros. Ele não é o Atman – pois quando um desses membros é amputado, o homem pode continuar vivendo e funcionando por meio de órgãos remanescentes. O corpo é controlado por outrem. Não pode ser o Atman, o controlador.

O Atman observa o corpo, com suas variadas características, ações e estágios de desenvolvimento. Que esse Atman, que é a realidade permanente, tem uma natureza distinta da do corpo é um fato que se evidencia por si mesmo.

O corpo é um feixe de ossos ligados pela carne. É sujo e cheio de imundícies. O corpo nunca pode ser identificado com o Atman, o conhecedor, o que existe por si só. A natureza do Atman é absolutamente distinta da do corpo.

Só o homem ignorante se identifica com o corpo, que é um composto de pele, carne, gordura, ossos e imundícies. O homem que possui o discernimento espiritual sabe que o Atman, seu verdadeiro ser, a única realidade suprema, é diferente do corpo.

O tolo pensa: “Eu sou o corpo.- O homem inteligente pensa: “Eu sou uma alma individual unida ao corpo.” Mas o sábio, na grandeza do seu conhecimento e discernimento espiritual, vê o Atman como a realidade e pensa: “Eu sou o Brahman.”

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Ó tolos, parai de identificar-vos com essa massa de pele, carne, gordura, ossos e imundícies. Identificai-vos com Brahman, o Absoluto, o Atman imanente a todos os seres. Só assim podereis atingir a paz suprema.

O homem inteligente pode ser versado no Vedanta e nas leis morais. Mas não tem a mínima possibilidade de libertar-se enquanto não deixar de se identificar com o corpo e os órgãos sensoriais. Essa identificação é produzida pela ilusão.

Nunca vos identificais com a sombra projetada pelo vosso corpo, nem com o seu reflexo, nem com o corpo que vedes num sonho ou em vossa imaginação. Por isso não deveis identificar-vos com esse corpo vivo.

Aqueles que vivem na ignorância identificam o corpo com o Atman. Essa ignorância é a causa e a origem do nascimento, da morte e do renascimento. Por isso deveis empenhar-vos diligentemente para destruí-la. Quando vosso coração estiver livre dessa ignorância, já não haverá nenhuma possibilidade de renascimento. Tereis alcançado a imortalidade.

O invólucro do Atman chamado de “invólucro vital” é composto pela força vital e pelos cinco órgãos da ação. O corpo é chamado “invólucro físico” e começa a existir quando é recoberto pelo invólucro vital. É assim que o corpo se envolve na ação.

Esse invólucro vital não é o Atman – pois que se compõe meramente dos ares vitais. Semelhante ao ar, ele entra e sai do corpo. Não sabe o que é bom ou ruim para si mesmo ou para os outros. É sempre dependente do Atman.

Purificação

A mente, ao lado dos órgãos da percepção, forma o “invólucro mental”. É ela que produz a consciência do “eu” e do “meu”. É ela, também, que nos permite discernir os objetos. É dotada do poder e da faculdade de diferenciar os objetos nomeando-os. É manifesta, envolvendo o “invólucro vital”.

O invólucro mental pode ser comparado ao fogo sacrificial. É alimentado pelo combustível de muitos desejos. Os cinco órgãos da percepção atuam como sacerdotes. Os objetos do desejo se derramam sobre ele como um fluxo continuo de oblações. É assim que este universo fenomenal começa a existir.

A ignorância não está em parte alguma a não ser na mente. A mente está repleta de ignorância, e esta produz a servidão do nascimento e da morte. Quando, no conhecimento do Atman, o homem transcende a mente, o universo fenomenal desaparece de sua consciência. Quando o homem vive no domínio da ignorância mental, o universo fenomenal existe para ele.

No sonho, a mente está desprovida do universo objetivo, mas cria por seu próprio poder um universo completo de sujeito e objeto. O estado de vigília não passa de um sonho prolongado. O universo fenomenal existe na mente.

No sono sem sonhos, quando a mente não está funcionando, nada existe. Esta é nossa experiência universal. O homem parece estar submetido ao nascimento e à morte. Isso é uma criação fictícia da mente, e não uma realidade.

O vento acumula as nuvens, e o vento torna a dispersá-las. A mente cria a servidão, e a mente também remove a servidão.

A mente cria o apego ao corpo e às coisas deste mundo. Com isso ela amarra o homem, tal como um animal é amarrado por uma corda. Mas é também a mente que cria no homem uma profunda repugnância pelos objetos dos sentidos, como por um veneno. Desse modo, ela o liberta de sua servidão.

A mente, portanto, é a causa da servidão do homem e também da sua libertação. Ela produz a servidão quando é obscurecida por rajas, mas produz a libertação quando se desembaraça de rajas e tamas e se purifica.

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Quando se pratica o discernimento e a impassibilidade, com exclusão de tudo o mais, a mente se purifica e caminha para a libertação. Assim, o homem sábio que busca a libertação deve desenvolver essas duas qualidades em seu íntimo.

O terrível tigre chamado mente impura ronda a floresta dos objetos dos sentidos. O homem sábio que busca a libertação não deve ir lá.

A mente do experimentador cria todos os objetos que ele experimenta no estado de vigília ou de sonho. Incessantemente, ela cria diferenças nos corpos, na cor, na condição social e na raça dos homens. Cria as variações dos gunas. Cria desejos, ações e os frutos das ações.

O homem é puro espírito, livre de qualquer apego. A mente o ilude. Acorrenta-o com os grilhões do corpo, dos órgãos sensoriais e da respiração vital. Cria nele a consciência do “eu” e do “meu”. Faz com que perambule, interminavelmente, entre os frutos das ações que ele produziu.

O erro de identificar Atman com não-Atman é a causa da roda do nascimento, morte e renascimento do homem. Essa falsa identificação é produzida pela mente. Portanto, é a mente que causa a miséria da roda do nascimento, morte e renascimento para o homem desprovido de discernimento e maculado por rajas e tamas.

Por isso o sábio, que conhece a Realidade, declarou estar a mente repleta de ignorância. Devido a essa ignorância, todas as criaturas do universo são irremediavelmente impelidas de lá para cá, como nuvens fustigadas pelo vento.

Por isso, aquele que busca a libertação deve trabalhar arduamente para purificar a mente. Quando a mente se purificou, a libertação é tão fácil de colher quanto o fruto que jaz a um palmo da nossa mão.

Procura sinceramente a libertação, e tua cobiça dos objetos sensoriais será arrancada pela raiz. Pratica o desapego em relação a todas as ações. Crê na Realidade. Devota-te à prática das disciplinas espirituais, tais como ouvir a palavra de Brahman, refletir e meditar sobre ela. Desse modo a mente se libertará do mal de rajas.

O “invólucro mental” não pode, pois, ser o Atman. Ele tem princípio e fim, e está sujeito à mudança. É a morada da dor. É um objeto da experiência. Aquele que vê não pode ser a coisa que é vista.

O invólucro do intelecto

A faculdade do discernimento com seus poderes de inteligência, junto com os órgãos da percepção, é conhecida como o “invólucro do intelecto”. Sua qualidade característica é a de ser o agente da ação. É ele que causa o nascimento, a morte e o renascimento do homem.

O poder de inteligência inerente ao “invólucro do intelecto- é um reflexo do Atman, a pura consciência. O “invólucro do intelecto” é um efeito de Maya. Ele possui a faculdade de conhecer e de agir e identifica-se inteiramente com o corpo, os órgãos sensoriais, etc.

Não tem começo, caracteriza-se pela sua consciência do ego e constitui o homem individual. É o indicador de todas as ações e empreendimentos. Impelido pelas tendências e impressões formadas em nascimentos anteriores, ele pratica ações virtuosas ou pecaminosas e sofre suas conseqüências.

O “invólucro do intelecto” acumula experiências passando por muitos ventres de grau superior ou inferior. Pertencem-lhe os estados de vigília e de sonho. É objeto de dores e alegrias.

Devido à sua consciência do “eu” e do “meu”, ele se identifica constantemente com o corpo e os estados físicos, assim como com os deveres inerentes aos diferentes estágios e ordens da vida. Esse “invólucro do intelecto- brilha com luz intensa devido à sua proximidade do Atman resplandecente. É urna roupagem do Atman, mas o homem se identifica com ele e vagueia ao redor do círculo de nascimento, morte e renascimento devido à sua ilusão.

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O Atman, que é pura consciência, é a luz que brilha no santuário do coração, o centro de toda força vital. É imutável, mas torna-se o “ator e o experimentador” quando é erroneamente identificado com o “invólucro do intelecto”.

O Atman assume as limitações do “invólucro do intelecto” porque é erroneamente identificado com esse invólucro, que dele se distingue por completo. Esse homem, que é o Atman, considera-se separado dele e de Brahman, que é o único Atman de todas as criaturas. Do mesmo modo, o homem ignorante pode considerar um jarro como algo diferente da argila de que este é feito.

Pela sua natureza, o Atman é eternamente imutável e perfeito, mas assume o caráter e a natureza de seus invólucros por ser erroneamente identificado com eles. Embora desprovido de forma, o fogo assumirá a forma do ferro incandescente.

Ilusão

O Discípulo:

Ou por causa da ilusão, ou por alguma outra razão, o Atman parece ser o eu individual. Essa errônea identificação não tem começo; e o que não tem começo também não pode ter fim.

Portanto, esse equívoco sobre a identidade da alma individual deve ser eterno, e sua perambulação através da roda do nascimento, morte e renascimento há de continuar por todo o sempre. Como, pois, pode haver libertação? Mestre, tende a bondade de explicar-me isso.

O Mestre

Tua pergunta é oportuna, ó homem prudente. Ouve-me com atenção. Uma coisa que foi produzida pela ilusão e só existe na tua imaginação jamais poderá ser aceita como um fato.

Pela sua natureza, o Atman é eternamente livre, sem forma e está além de qualquer ação. Sua identidade com os objetos é imaginária, irreal. Dizemos “o céu é azul”, mas o céu tem alguma cor?

O Atman é a testemunha, está além de qualquer atributo, de qualquer ação. Pode ser diretamente percebido como pura consciência e infinita bem-aventurança. Sua aparência de alma individual decorre da ilusão de nosso entendimento e carece de realidade. Por sua própria natureza, essa aparência é irreal. Quando nossa ilusão é removida, ela deixa de existir.

Sua aparência de alma individual só dura enquanto dura a nossa ilusão, uma vez que esse equívoco resulta de uma ilusão do nosso entendimento. Enquanto perdurar a ilusão, a corda parecerá ser uma cobra. Finda a ilusão, a cobra deixa de existir.

É fato que a ignorância e seus efeitos existem desde sempre. Mas a ignorância, embora não tenha tido princípio, chega ao fim com o despontar do conhecimento. Ela é completamente destruída, com suas raízes e tudo o mais, tal como os sonhos, que se desvanecem por inteiro ao acordarmos. Quando uma coisa que antes não existia começa a existir, isso implica que ela era inexistente desde sempre. Mas essa inexistência, embora não tenha tido princípio, cessa assim que tal coisa começa a existir. Fica claro, pois, que a ignorância, embora não tenha tido princípio, não é eterna.

Vemos que um estado anterior de não-existência pode chegar ao fim, muito embora não tenha princípio. O mesmo sucede com a aparência de um eu individual. Essa aparência se deve a uma falsa identificação do Atman com o intelecto e os demais invólucros. O Atman, por sua própria natureza, é essencialmente distinto e separa-do deles. A identificação do Atman com o intelecto, etc., é causada pela ignorância.

Essa falsa identificação só pode ser dissipada pelo perfeito conhecimento. O perfeito conhecimento, segundo as escrituras reveladas, é a compreensão do Atman como uno com Brahman.

Ela é alcançada por meio de um absoluto discernimento entre o Atman e o não-Atman. Por isso deve o homem praticar o discernimento entre o Atman e o eu individual.

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Assim como uma água barrenta reluz cristalinamente quando o barro é removido, assim o Atman reluz com puro brilho quando se lhe removem as impurezas.

Quando as trevas da irrealidade se desvanecem, o eterno Atman é claramente revelado. Por isso o homem deve empenhar-se em libertar o Atman das irrealidades do egotismo e da ilusão.

O “invólucro do intelecto”, que estivemos discutindo, não pode ser o Atman pelas seguintes razões: ele está sujeito a mudanças; a inteligência não é sua natureza inerente; ele é finito; é um objeto da experiência; é transitório. O não-eterno não pode, pois, ser o eterno Atman.

O invólucro da bem-aventurança

O “invólucro da bem-aventurança”2 é o invólucro do Atman que recebe um reflexo do próprio Atman bem- aventurado. No entanto, esse invólucro é uma criação da nossa ignorância. Sua natureza consiste nos vários graus de felicidade que são experienciados quando um objeto desejado é conquistado. Sua natureza bem-aventurada é sentida espontaneamente pelos homens retos quando eles colhem os frutos de suas boas ações. Ele expressa a alegria que todos os seres vivos podem experimentar sem fazer esforço algum nesse sentido.

O “invólucro da bem-aventurança- nos é plenamente revelado no estado de sono profundo. É parcialmente revelado nos estados de vigília e de sonho, quando um objeto desejável está sendo desfrutado.

Esse “invólucro da bem-aventurança” não pode ser o Atman pelas seguintes razões: ele tem limitações; é um efeito de Maya; sua natureza aprazível é sentida como o resultado de boas ações; ele é do mesmo tipo dos demais invólucros, que são produtos de Maya.

Se refletirmos e meditarmos sobre a verdade das escrituras, transcendendo todos os cinco invólucros da ignorância, compreenderemos a Existência fundamental – que é o Atman, a testemunha, a consciência infinita.

O Atman brilha por si mesmo, é distinto dos cinco invólucros. É a testemunha dos três estados de consciência. Ele é existência, imutável, puro, eternamente bem-aventurado. Deve ser compreendido pelo homem de discernimento como o Atman que habita em seu íntimo.

Atman é Brahman

O Discípulo:

Mestre, se rejeitarmos esses cinco invólucros corno irreais, parece-me que nada más resta senão o vazio. Como, então, pode haver uma existência que o sábio pode compreender como sendo una com o seu Atman?

O Mestre:

Eis uma boa pergunta, ó homem prudente. Teu argumento é hábil. No entanto, deve haver uma existência, uma realidade, que perceba a consciência do ego e os invólucros e também esteja cônscia do vácuo que é a ausência deles. Essa realidade que existe por si mesma permanece despercebida. Aguça a percepção de que podes conhecer o Atman, que é o conhecedor.

Aquele que experimenta está cônscio de si mesmo. Sem um experimentador, não pode haver autoconsciência.

2 A idéia do ego no homem

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O Atman é a sua própria testemunha, já que está cônscio de si mesmo. O Atman não é outro senão Brahman.

O Atman é pura consciência, claramente manifesta como subjacente aos estados de vigília, de sonho e de sono sem sonhos. É experimentada interiormente como consciência ininterrupta, a consciência de que eu sou eu. É a imutável testemunha que experimenta o ego, o intelecto e tudo o mais, com suas várias formas e mudanças. É compreendido no fundo do nosso coração como existência, conhecimento e bem- aventurança absolutos. Realiza esse Atman no santuário do teu próprio coração.

O tolo vê o reflexo do sol na água de um jarro e pensa que ele é o sol. Enredado na ignorância de sua ilusão, o homem vê o reflexo da Pura Consciência nos invólucros e o confunde com o Eu verdadeiro.

Para olhar o sol, deves afastar-te do jarro, da água e dos reflexos do sol na água. O sábio sabe que estes só são revelados pelo reflexo do sol, que brilha por si mesmo. Não são o próprio sol.

O corpo, o invólucro do intelecto, o reflexo da consciência sobre ele – nada disso é o Atman. O Atman é a testemunha, a consciência infinita, o revelador de todas as coisas, mas difere de todas elas, quer sejam grosseiras ou sutis. É a realidade eterna, onipresente, que a tudo permeia, a mais sutil das sutilezas. Não tem interior nem exterior. É o Eu verdadeiro, oculto no santuário do coração. Compreende plenamente a verdade do Atman. Sê livre do mal e da impureza, e passarás além da morte.

Conhece o Atman, transcende os infortúnios e atinge a fonte da alegria. Sê iluminado por esse conhecimento, e nada terás a temer. Se queres encontrar a libertação, não há outro meio de romper os grilhões do renascimento.

O que pode destruir a servidão e a miséria deste mundo? O conhecimento de que o Atman é Brahman. É então que compreendes Aquele que é o um sem um segundo, a suprema bem-aventurança.

Compreende Brahman e não haverá mais retomo a este mundo – a morada de todos os infortúnios. Deves compreender absolutamente que o Atman é Brahman.

Então alcançarás Brahman para sempre. Ele é a verdade. É existência e conhecimento. É absoluto. É puro e existe por si mesmo. É alegria eterna, alegria sem fim. Não é outro senão o Atman.

O Atman é uno com Brahman: tal é a verdade suprema. SÓ Brahman é real. Nada existe senão Ele. Quando O conhecemos como a realidade suprema, não há outra existência senão Brahman.

O universo

Brahman é a realidade – a existência única, absolutamente independente do pensamento ou da idéia humana. Devido à ignorância de nossa mente humana, o universo parece compor-se de diversas formas. Ele é unicamente Brahman.

Um jarro feito de argila nada mais é do que argila. É essencialmente argila. A forma do jarro não tem existência própria. Que é, pois, o jarro? Mero nome inventado!

A forma do jarro nunca poderá ser percebida separada da argila. Que é, então, o jarro? Uma aparência! A realidade é a própria argila.

Este universo é um efeito de Brahman. Nunca será outra coisa senão Brahman. Separado de Brahman, ele não existe. Fora d’Ele nada existe. Quem diz que este universo tem uma existência independente continua sendo vítima da ilusão. É como um homem que fala durante o sono.

“O universo é Brahman” – assim diz o grande vidente do Atharva Veda. O universo, pois, nada mais é do que Brahman. Sobrepõe-se a Ele. Não tem existência própria, fora da sua base.

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Se o universo, tal como o percebemos, fosse real, o conhecimento de Atman. não poria termo à nossa ilusão. As escrituras seriam falsas. As revelações das Encarnações Divinas não teriam sentido. Essas alternativas não podem ser consideradas nem desejáveis nem benéficas por nenhum indivíduo pensante.

Sri Krishna, o Senhor Encarnado, que conhece o segredo de todas as verdades, diz no Gita: “Embora eu não esteja em nenhuma criatura, todas as criaturas existem em mim. Não quero dizer que elas existam em mim fisicamente. Esse é o meu divino mistério. Meu Ser sustenta todas as criaturas e lhes, dá existência, mas não tem nenhum contato físico com elas”.

Se este universo fosse real, continuaríamos a percebê-lo no sono profundo. Mas nada percebemos nesse estado. Portanto ele é irreal, a exemplo de nossos sonhos.

O universo não existe fora do Atman. A percepção que temos dele como dotado de existência independente é falsa, tal como a nossa percepção do azul no céu. Como pode um atributo sobreposto ter uma existência qualquer, fora de seu substrato? SÓ a nossa ilusão pode produzir essa falsa concepção da realidade subjacente.

Não importa o que o homem iludido pense estar percebendo; na verdade, ele está vendo Brahman, e nada mais que Brahman. Ele vê uma madrepérola e imagina que está vendo prata. Vê Brahman e imagina que Ele é o universo. Porém esse universo, que é sobreposto a Brahman, não passa de um nome.

Eu sou Brahman

Brahman é supremo. É a realidade – o um sem um segundo. É pura consciência, livre de qualquer mácula. É a própria serenidade. Não tem começo nem fim. Não conhece mudanças. É alegria eterna.

Brahman transcende a aparência do múltiplo, criado por Maya. É eterno, perpetuamente fora do alcance da dor; é indiviso, imensurável, sem forma, sem nome, indiferenciado, imutável. Ele brilha com a Sua própria luz. Está em todas as coisas que podem ser conhecidas neste universo.

Os videntes iluminados O percebem como a realidade suprema, infinita, absoluta, sem partes – a pura consciência. E n’Ele descobrem que o conhecedor, o conhecimento e a coisa conhecida se tornam unos.

Eles O conhecem como a realidade que não pode ser rejeitada (já que Ele está sempre presente na alma humana) nem apreendida (já que ele está além do poder da mente e da palavra). Sabem que

Ele é imensurável, sem princípio, sem fim, supremo em Sua glória. Eles compreendem a verdade: “Eu sou Brahman”.

Isso és Tu

As escrituras estabelecem a absoluta identidade de Atman e Brahman ao declarar repetidamente: “Isso és Tu.” Os termos “Brahman” e “Atman”, no seu verdadeiro significado, se referem respectivamente a “Isso” e “TU”.

No seu sentido literal, superficial, “Brahman” e “Atman” têm atributos opostos, como o sol e o vaga-lume, o rei e seu servo, o oceano e o poço, ou o monte Meru e o átomo. A identidade de ambos só é estabelecida quando os compreendemos no seu verdadeiro significado, e não num sentido superficial.

“Brahman” pode referir-se a Deus, o soberano de Maya e criador do universo. O “Atman” pode referir-se à alma individual, associada com os cinco invólucros que são efeitos de Maya. Desse ponto de vista, ele possui atributos opostos. Mas essa aparente oposição é causada por Maya e pelos seus efeitos. Portanto, ela não é real, mas sobreposta.

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Esses atributos produzidos por Maya e seus efeitos são sobrepostos a Deus e à alma individual. Quando são completamente eliminados, nem a alma nem Deus permanecem. Se tomarmos o reino de um rei e as armas de um soldado, não existem nem soldado nem rei.

As escrituras repudiam qualquer idéia de uma dualidade em Brahman. Que o homem busque a iluminação no conhecimento de Brahman, como mandam as escrituras. Então aqueles atributos, que nossa ignorância sobrepôs a Brahman, desaparecerão.

“Brahman não é nem o universo denso nem o universo sutil. O mundo aparente é produzido pela nossa imaginação na sua ignorância. Ele não é real. É como ver na corda a serpente. É como um sonho passageiro- – assim o homem deve praticar o discernimento espiritual e libertar-se da consciência que tem do mundo objetivo.

Então, que ele medite sobre a identidade de Brahman e de Atman e compreenda a verdade.

Pelo discernimento espiritual, que ele perceba o verdadeiro sentido profundo dos termos “Brahman” e “Atman”, compreendendo assim a absoluta identidade de ambos. Vê a realidade em ambos, e verás que não há senão um.

Quando dizemos: “Esse homem é o mesmo Devadatta que encontrei antes”, estabelecemos uma identidade pessoal desconsiderando os atributos que lhe foram sobrepostos pelas circunstâncias do nosso encontro anterior. De modo exatamente idêntico, quando consideramos o ensinamento espiritual expresso nas palavras “Isso és Tu”, devemos desprezar os atributos que foram sobrepostos a “Isso” e “Tu”.

O homem sábio dotado de verdadeiro discernimento compreende que a essência de Brahman e Atman é a Pura Consciência e assim percebe sua identidade absoluta. A identidade de Brahman e Atman é declarada em centenas de textos sagrados.

Abandona a falsa noção de que o Atman é esse corpo, esse fantasma. Medita sobre a verdade de que Atman não é “nem denso nem sutil, nem baixo nem alto”, de que ele existe por si mesmo, livre como o céu, fora do alcance do pensamento. Purifica teu coração até chegares ao conhecimento de que “Eu sou Brahman”. Realiza teu próprio Atman, a consciência pura e infinita.

Assim como um jarro ou um vaso de argila nada mais é do que argila, assim este universo, nascido de Brahman, essencialmente Brahman, é apenas Brahman – pois nada existe fora de Brahman, nada existe além disso. Isso é a realidade. Isso é o nosso Atman. Portanto, “Isso és Tu”- puro, bem-aventurado, supremo Brahman, o primeiro sem um segundo.

Podes sonhar com lugares, tempos, objetos, indivíduos e assim por diante. Mas eles são irreais. No estado de vigília experimentas este mundo, mas essa experiência brota da tua ignorância. Ela é um sonho prolongado e, portanto, irreal. Como irreais são esse corpo, esses órgãos, essa respiração vital, essa consciência do ego. Logo, “Isso és Tu” – o puro, o bem-aventurado, o supremo Brahman, o primeiro sem um segundo.

Por causa da ilusão, podes tomar um pelo outro. Mas, quando conheces a tua verdadeira natureza, então só essa natureza existe, nada mais há senão isso. Quando o sonho termina, o universo do sonho se desvanece. Parece-te ao despertares, que és outro e não tu?

Casta, credo, família e linhagem não existem em Brahman. Brahman não tem nome nem forma, transcende o mérito e o demérito, está além do tempo, do espaço e dos objetos da experiência sensorial. Assim é Brahman, e “Isso és Tu”. Medita sobre esta verdade.

Brahman é supremo. Está além do poder de expressão da palavra, mas é conhecido pelo olho da pura iluminação. Brahman é pura, absoluta consciência, a eterna realidade. Assim é Brahman, e “Isso és Tu”. Medita sobre esta verdade.

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Brahman está fora do alcance das seis ondas – fome, sede, tristeza, ilusão, decadência e morte – que varrem o oceano do mundo. Aquele que busca a união com Brahman deve meditar sobre Ele no santuário do coração. Ele está fora do alcance dos sentidos. O intelecto não pode compreendê-lo. Ele está fora do alcance do pensamento. Assim é Brahman, e “Isso és Tu”. Medita sobre essa verdade.

Brahman é a base sobre a qual este universo múltiplo, a criação da ignorância, parece repousar. Ele é o Seu próprio suporte. Não é nem o universo denso nem o universo sutil. É indivisível. Está além da comparação. Assim é Brahman, e “Isso és Tu”. Medita sobre essa verdade.

Brahman é livre de nascimento, crescimento, mudança, declínio, doença e morte. É eterno. É a causa da evolução do universo, da sua preservação e dissolução. Assim é Brahman, e “Isso és Tu”. Medita sobre essa verdade.

Brahman não conhece diferenciação nem morte. É calmo como uma vasta superfície de água sem ondas. Assim é Brahman, e “Isso és Tu”. Medita sobre essa verdade.

Embora único, ele é a causa do múltiplo. É a causa única; fora d’Ele não há outra. Ele não tem causa fora de Si mesmo. É independente também da lei da causação e permanece único. Assim é Brahman, e “Isso és Tu”. Medita sobre essa verdade.

Brahman é imutável, infinito, imperecível. Está além de Maya e de seus efeitos. É bem-aventurança eterna, imorredoura. É puro. Assim é Brahman, e “Isso és Tu”. Medita sobre essa verdade.

Brahman é a Realidade única que aparece à nossa ignorância como o universo múltiplo de nomes, formas e mudanças. Como o ouro de que se fazem numerosos Ornamentos, ele permanece imutável em si mesmo. Assim é Brahman, e “Isso és Tu”. Medita sobre essa verdade.

Nada existe além d’Ele. Ele é maior do que o maior. É o eu mais recôndito, a alegria perene em nosso ser. É a existência, o conhecimento e a bem-aventurança absolutos. É infinito, eterno. Assim é Brahman, e “Isso és Tu”. Medita sobre essa verdade.

Medita sobre esta verdade, seguindo os argumento das escrituras com o auxilio da razão e do intelecto. Assim ficarás livre da dúvida e da confusão e compreenderás a verdade de Brahman. Essa verdade se tornará tão clara para ti quanto a água contida na palma da tua mão.

Devoção

Assim como um rei é claramente “conhecido no meio do seu exército”, também deves perceber Brahman como pura consciência, distinto de todas as imperfeições. Instala-te para sempre no Atman. Que este mundo manifesto se dissolva em Brahman.

Brahman reside no santuário do coração – a eterna existência, o supremo, o primeiro sem um segundo, fora dos aspectos densos e sutis deste universo. O homem que habita esse santuário, unido com Brahman, já não está sujeito ao renascimento e à morte.

A verdade de Brahman pode ser compreendida intelectualmente. Mas a consciência do ego é profundamente arraigada e poderosa porque existe desde sempre. Ela cria a impressão de que “eu sou o ator, sou eu quem experimenta”. Essa impressão produz a servidão do renascimento e da morte. Só se pode removê-la por meio do ardente empenho em viver constantemente em união com Brahman. Os sábios definem a libertação como a remoção de todas essas impressões e, portanto, dos desejos por ela causados.

É a ignorância que causa a impressão de identidade com o corpo, com os órgãos sensoriais e com tudo o mais que não é o Atman. Sábio é o homem que venceu essa ignorância através da devoção ao Atman.

Conhece o teu verdadeiro Atman como a testemunha da mente e do intelecto e das ondas de pensamento que neles se originam. Eleva constantemente uma única onda de pensamento: “Eu sou Brahman”. Desse modo, te libertarás da identificação com o não-Atman.

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Cessa de seguir o caminho do mundo, cessa de seguir o caminho da carne, cessa de seguir o caminho da tradição. Liberta-te dessa falsa identificação e conhece o verdadeiro Atman.

Quando um homem segue o caminho do mundo, o caminho da tradição e o caminho da carne, o conhecimento da Realidade ainda não nasceu no seu íntimo.

Os sábios dizem que esse tríplice caminho é como unia corrente de ferro atada aos pés do homem que tenta fugir da prisão deste mundo. Aquele que dela se desembaraça alcança a libertação.

Quando se mergulha o sândalo na água suja, sua deliciosa fragrância pode ser sobrepujada pelo cheiro da sujeira. Mas, assim que se limpa o sândalo, o mau cheiro desaparece e o ar se enche de fragrância celestial.

A fragrância celestial do Atman é sobrepujada pelo mau cheiro de incontáveis desejos perniciosos, que são como lama em nosso ser.

Como o sândalo, sua fragrância encherá o ar quando ele se limpar pelo constante atrito com o pensamento: “Eu sou Brahman”.

A doce fragrância do Atman é sobrepujada por inumeráveis desejos das coisas dos sentidos. Esses desejos podem ser destruídos pela devoção ao Atman; então a luz do Atman se toma manifesta.

À medida que se devota ao Atman, a mente se liberta gradualmente do desejo de objetos sensoriais. Quando ela se libertou completamente de todo desejo, a visão do Atman deixa de ser obstruída.

Pela constante devoção ao Atman, as impurezas da mente são removidas. Todos os desejos são obliterados. Empenha-te, pois, em destruir essa ilusão.

Tamas é vencida tanto por rajas como por sattwa; rajas é vencida por sattwa; sattwa é vencida quando o puro Atman resplandece. Portanto, fixa-te em sattwa, empenha-te em destruir essa ilusão.

Persevera na tua devoção, sabendo que o corpo certamente continuará a viver enquanto tiver de fazê-lo. Empenha-te com paciência e constância em destruir essa ilusão.

Pensa: “Eu sou Brahman; não sou a alma individual”, e rejeita tudo o que seja não-Atman. Empenha-te, pois, em destruir essa ilusão criada no passado por teu desejo dos objetos sensoriais.

Aprende a verdade das escrituras, reflete sobre elas e conhece, pela tua própria experiência direta, que o Atman que habita no teu íntimo é o Atman em todas as coisas. Empenha-te, pois, em destruir essa ilusão até seus derradeiros vestígios.

O homem sábio não está absolutamente preocupado em adquirir e gastar. Portanto, empenha-te em destruir essa ilusão pela constante e sincera devoção a Brahman.

Medita sobre a verdade “Isso és Tu” e compreende a identidade do Atman com Brahman. Empenha-te em destruir essa ilusão e fixa-te no conhecimento de que Atman e Brahman são um.

Com desvelo e concentração deves empenhar-te em destruir essa ilusão até que a identificação do Atman com esse corpo cesse por completo.

Embora possas ter atingido um estágio no qual o universo e suas criaturas pareçam simples imagens oníricas, desprovidas de realidade, ainda assim, ó homem prudente, deves empenhar-te constantemente em destruir essa ilusão.

Não desperdices um só momento em preocupações com os negócios deste mundo ou com a atração dos objetos sensoriais. Lembra-te de Brahman mesmo quando estiveres dormindo. Medita sobre o Atman que habita no teu coração.

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Falsa identificação

Cessa de identificar-te com esse corpo físico corruptível, nascido da carne do pai e da mãe. Considera-o impuro, como se fosse um pária. Alcança a meta da vida realizando a tua união corri Brahman.

O ar dentro de um jarro é uno com o ar de toda a parte. Do mesmo modo, teu Atman é uno com Brahman. ó homem prudente, desembaraça-te de toda consciência de separação e absorve-te no silêncio.

Compreende que és uno com o auto-iluminado Brahman, fundamento de toda existência. Rejeita o universo e o corpo físicos como recipientes de sujeira.

A consciência do “eu” está arraigada no corpo. Funde essa consciência com o Atman, que é existência, conhecimento e bem-aventurança absolutos. A consciência do corpo sutil constitui outra limitação. Desembaraça-te dela também. Permanece unido com o Absoluto por todo o sempre.

A miragem do universo está refletida em Brahman, qual cidade num espelho. Conscientiza-te de que “eu sou Brahman” e terás alcançado a meta da vida.

O Atman é a realidade. É o teu eu verdadeiro, fundamental. É pura consciência, o primeiro sem um segundo, a bem-aventurança absoluta. Está além da forma e da ação. Compreende tua identidade com ele. Cessa de identificar-te com os invólucros da ignorância, que são como máscaras usadas por um ator.

O universo de aparências é efetivamente irreal. A consciência do ego também há de ser irreal, já que observamos como ele vem e vai. Mas estamos igualmente cônscios de ser ele a testemunha, o conhecedor de todas as coisas. Essa consciência não pertence à consciência do eu nem às demais percepções, que só existem durante um breve momento.

O Atman é a testemunha do ego e de tudo o mais. Está sempre presente, mesmo no sono profundo. As escrituras declaram que o Atman não conhece nascimento nem morte, distinguindo-se, pois, dos invólucros densos e sutis.

O Atman deve ser necessariamente imutável e eterno, já que é o conhecedor de tudo o que é mutável. A não-existência dos invólucros densos e sutis pode ser repetidamente experimentada quando sonhamos ou quando mergulhamos no sono profundo.

Cessa, pois, de identificar-te com essa massa de carne, o corpo denso, e com o ego, o invólucro sutil. Ambos são ilusórios. Conhece o teu Atman – a pura, infinita consciência, eternamente existente no passado, no presente e no futuro. Assim encontrarás a paz.

Cessa de identificar-te com a raça, com o clã, com o nome, com a forma e com o modo de vida. Tudo isso pertence ao corpo, a roupagem da decadência. Abandona também a idéia de que és o ator das ações ou o pensador dos pensamentos. Tudo isso pertence ao ego, o invólucro sutil. Compreende que és o Ser que ó eterna bem-aventurança.

O ego

A vida humana de servidão ao mundo do nascimento e da morte tem muitas causas. A raiz de todas elas é o ego, o primogênito da ignorância.

Enquanto o homem se identificar com esse ego iníquo, não haverá nenhuma possibilidade de libertação. Pois a libertação é exatamente o oposto dele.

Uma vez libertado do eclipsante demônio do ego, o homem reconquista sua verdadeira natureza, tal como a lua exibe seu esplendor quando libertada das trevas de um eclipse. Então ele se toma puro, infinito, eternamente bem-aventurado e auto-iluminado.

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Quando a mente de um homem está subjugada pela extrema ignorância, ele cria a consciência do ego ao identificar-se com os invólucros. Quando o ego é completamente destruído, a mente se livra dos obstáculos que impedem o conhecimento da sua unidade com Brahman.

O ego é uma serpente poderosa e mortal, e as gunas são suas três cabeças coléricas. Ele jaz enrodilhado em tomo do tesouro da bem-aventurança de Brahman, a quem vigia para seu próprio uso. O homem sábio, inspirado pelas sagradas escrituras, decepa as três cabeças com a espada do conhecimento e destrói completamente a serpente. Desse modo ele encontra o tesouro da suprema bem-aventurança.

Não há esperança de cura para um homem enquanto subsistir qualquer vestígio de veneno no seu corpo. Analogamente, o aspirante espiritual não pode alcançar a libertação enquanto subsistir qualquer vestígio do ego no seu ser.

Destrói completamente o ego. Controla as numerosas ondas de perturbação que ele levanta na mente. Discerne a realidade e compreende que “Eu sou Isso”.

Tu és pura consciência, a testemunha de todas as experiências. Tua verdadeira natureza é o júbilo. Cessa neste exato momento de identificar-te com o ego, com o agente da ação, criado pela ignorância. Sua inteligência é apenas aparente, um reflexo do Atman, que é pura consciência. Ele lhe rouba a paz e a alegria no seio do Atman. Ao identificar-te com ele, caíste na armadilha do mundo – as misérias do nascimento, decadência e morte.

Tu és o Atman, o Ser infinito, a pura, imutável consciência que permeia todas as coisas. Tua natureza é a bem-aventurança e tua glória não tem mácula. Por te identificares com o ego, estás acorrentado ao nascimento e à morte. Tua servidão não tem outra causa.

Esse ego é teu inimigo. É como um espinho na garganta de quem está comendo. Destrói esse inimigo com a poderosa espada do conhecimento e sê livre para usufruir a soberania de teu próprio império, a bem- aventurança do Atman.

Examina todas as atividades do ego e o egoísmo que elas implicam. Alcança a suprema realidade e liberta- te da luxúria. Habita no silêncio e usufrui a bem-aventurança do Atman. Liberta-te de toda consciência de separatividade e realiza em Brahman tua natureza infinita.

Esse eu poderoso pode ser arrancado pelas raízes. Mas se a mente o alimentar por um momento que seja, ele renascerá e provocará cem malefícios. Ele é como uma nuvem carregada de tempestade na estação chuvosa.

Conquista esse inimigo, o ego. Não lhe dês oportunidade deixando teus pensamentos se apegarem aos objetos sensoriais. Tais pensamentos lhe dão vida, tal como a água dá vida a um limoeiro ressequido.

Se te identificares com o corpo, a luxúria brotará em ti. Liberta-te da consciência do corpo e ficarás livre da luxúria. Assim, se estiveres apegado a esse ego que tem mantém separado de Brahman, procurarás o prazer nos objetos sensoriais. E esta é a causa da sujeição ao nascimento e à morte.

Desejos

Quanto mais um homem satisfaz seus desejos no mundo objetivo, mais esses desejos aumentam. Mas, se ele os controlar e deixar de satisfazê-los, as sementes do desejo serão destruídas. Que ele adquira, pois, o autocontrole.

Quando o desejo se fortalece, perde-se o autocontrole. Quando se perde o autocontrole, o desejo toma-se mais forte que nunca. O homem que vive desse modo jamais escapará à roda de nascimento e morte.

O desejo é intensificado quando permitimos que nossos pensamentos se demorem nos objetos sensoriais e busquem satisfação temporária no mundo objetivo. Para romper a cadeia do nascimento e da morte, o aspirante espiritual deve reduzir a cinzas as causas do desejo.

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O desejo que é alimentado dessas duas maneiras trará a sujeição à roda de nascimento e morte. Mas há um meio de destruir os três o desejo e suas duas causas. Em quaisquer circunstâncias, sempre, em toda parte e a qualquer respeito, deves considerar tudo como Brahman e apenas Brahman. Fortalece tua vontade de conhecer a Realidade, e esses três males se dissolverão.

Cessa de buscar a satisfação de teus desejos no mundo objetivo e deixarás de comprazer-te nos objetos sensoriais. Cessa de comprazer-te nos objetos sensoriais e teu desejo será destruído. Quando todos os desejos desaparecem, vem a libertação. É a chama-da-libertação-em-vida.

Assim como as espessas trevas se dissipam ante o radioso esplendor do sol nascente, assim o anseio de vida do ego é inteiramente removido quando a aspiração ao conhecimento da Realidade se intensifica.

Quando o senhor do dia ascende, a escuridão desaparece com sua rede de males. Do mesmo modo, quando se experimenta a bem-aventurança absoluta, não há mais servidão nem qualquer vestígio de tristeza.

Deixa este mundo objetivo desaparecer dos teus pensamentos. Deixa tua mente habitar na Realidade, que é repleta de alegria. Quer estejas considerando as aparências exteriores ou meditando no teu íntimo, absorve-te resolutamente em Brahman. Assim deves passar o teu tempo, até que os resíduos de teus karmas passados se extingam.

Recolhimento

Que não haja negligência na tua devoção a Brahman. A negligência na prática do recolhimento é a morte – assim falou o vidente Sanatkumar, filho de Brahma.

Para o aspirante espiritual, não há maior mal do que negligenciar o recolhimento. Daí surge a ilusão. Da ilusão advém a consciência do ego. Do ego vem a servidão e da servidão a miséria.

Um homem pode ser culto, mas se negligenciar a prática do recolhimento ele se voltará para os engodos dos sentidos. As tendências perniciosas da sua mente o seduzirão tal como a pecadora seduz o amante.

Quando se afasta o carriço na superfície de um lago, ele retoma imediatamente ao seu lugar. Assim Maya toma a acercar-se até mesmo do homem sábio, se ele deixar de praticar o recolhimento.

Quando a mente se afasta de Brahman, seu ideal, para se apegar, ainda que ligeiramente, à sensualidade dos objetos, ela continua a descer devido à negligência do recolhimento, como uma bola a rolar escada abaixo.

Quando a mente se volta para os objetos sensoriais, ela se enreda nos prazeres que deles derivam. A complacência nesses tais pensamentos excita o desejo e o homem é impelido a satisfazê-lo.

Por isso, para o homem dotado de discernimento espiritual, para o conhecedor de Brahman, não há morte, mas negligência do recolhimento. O homem que está absorto no recolhimento alcança a libertação. Portanto, empenha-te ao máximo em permanecer absorto no Atman.

Pela negligência do recolhimento, o homem é distraído da percepção de sua natureza divina. Quem assim se deixa distrair decai – e os decaídos chegam sempre à ruína. Para eles, é muito difícil o reerguimento.

Rejeição das aparências

Renuncia, pois, aos objetos sensoriais, que são a raiz de todos os males. Aquele que alcançou a libertação nesta vida permanece liberto quando abandona o corpo. O Yajur-Veda declara que o homem está sujeito ao medo enquanto continuar a ver a mínima diferença entre ele próprio e Brahman.

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Enquanto o homem – mesmo se possuir o discernimento – estabelecer a menor distinção entre ele e o Infinito Brahman, o medo surgirá nele. Essa distinção só é vista por causa da ignorância.

A razão, a tradição sagrada e centenas de textos das escrituras declaram que o universo objetivo não tem existência real. Aquele que se identifica com ele depara com hostes após hostes de sofrimentos.

Aquele que se devota à contemplação da Realidade torna-se livre e alcança a glória eterna do Atman. Mas aquele cuja mente se compraz no irreal se perderá.

O aspirante espiritual deve perseguir o irreal que causa a servidão. Deve permanecer firme na visão do Atman. lembrando-se de que “esse Atman sou eu”. A devoção constante a Brahman e a meditação sobre a nossa identidade com Brahman nos trará alegria e abolirá a experiência imediata do sofrimento causado pela ignorância.

A busca dos objetos sensoriais resulta no aumento de nossas tendências perniciosas, que se agravam cada vez mais. Devemos estar cônscios disso por meio do discernimento espiritual e afastar o pensamento dos objetos sensoriais. Dedica-te constantemente à meditação sobre o Atman.

Recusa a comprazer-te nos objetos sensoriais e a paz surgirá no teu coração. Quando o coração está em paz, a visão do Atman se faz presente. Quando o Atman for percebido diretamente, nossa servidão a este mundo é aniquilada. Portanto, a recusa a comprazer-se nos objetos sensoriais é o caminho da libertação.

Se o homem for instruído, capaz de discernir entre o real e o irreal, convicto da autoridade das escrituras, possuído pela visão do Atman e desejoso de libertação, como poderá apegar-se como uma criança ao que é irreal e suscetível de provocar a sua queda?

Não pode haver libertação para aquele que está apegado ao corpo e aos seus prazeres. O homem que se libertou está livre do apego ao corpo e aos seus prazeres. O homem adormecido não está desperto, e o homem desperto não está adormecido. Esses dois estados de consciência são opostos um ao outro por suas próprias naturezas.

O homem que conhece o Atman e o vê interior e exteriormente como a base de todas as coisas animadas e inanimadas alcançou de fato a libertação. Ele rejeita todas as aparências como irreais e se absorve na visão do Atman, que é o Ser Absoluto, Infinito.

Ver no Atman, que é único, o princípio de todas as aparências, é o caminho que leva à libertação de toda servidão. Não há conhecimento mais elevado do que o de saber que o Atman é único e está em toda parte. O homem compreende que o Atman está em toda parte e em todas as coisas quando rejeita as aparências e se devota constantemente ao Atman, o Ser Eterno.

Mas como pode o homem rejeitar as aparências se vive identificado com o corpo, se sua mente está apegada aos objetos sensoriais e se ele persegue a satisfação de seus desejos? Tal rejeição só pode ser concretizada mediante um esforço tenaz. Pratica o discernimento espiritual e devota-te apaixonadamente ao Atman. Renuncia às recompensas egoístas que se obtém pela prática de ações e deveres. Abandona a busca do prazer nos objetos sensoriais. Deseja unicamente a posse da eterna beatitude.

Dizem as escrituras: “Quando o homem que ouviu a verdade de Brahman dos lábios do seu mestre se torna calmo, autocontrolado, satisfeito, paciente e profundamente absorto na contemplação, ele realiza o Atman no seu próprio coração e vê o Atman em todas as coisas”.

Para esse aspirante espiritual a passagem acima prescreve a profunda contemplação do Atman a fim de que o Atman, que está em todas as coisas, possa ser compreendido.

A corda e a cobra

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É impossível, mesmo para o sábio, desunir o ego de um só golpe – ele está por demais arraigado na natureza humana e perdura com seus numerosos desejos, através de incontáveis nascimentos. O ego só é completamente abolido naqueles que se tomaram iluminados graças à realização de sua mais elevada consciência transcendental.

Quando a mente de um homem é obnubilada pela ignorância, o poder de projeção, cuja natureza é a inquietação, leva-o a identificar-se com o ego. O ego o seduz e o perturba com os desejos que são seus atributos.

É difícil vencer o poder de projeção enquanto o poder obnubilante da ignorância não for completamente destruído. Quando um homem é capaz de distinguir tão claramente entre o Atman e as aparências externas quanto entre o leite e a água, então o véu da ignorância que recobre o Atman desaparecerá naturalmente. Quando a mente já não é distraída pela miragem dos objetos sensoriais, todo obstáculo à compreensão do Atman foi efetivamente removido.

Quando um homem se toma iluminado pelo conhecimento, surge em seu íntimo o perfeito discernimento que distingue claramente o verdadeiro Ser, o Atman, das aparências exteriores. Desse modo, ele se liberta dos grilhões da ilusão criada por Maya e deixa de estar sujeito à morte e ao renascimento no mundo da mutação.

O conhecimento de que nós somos Brahman é como um incêndio que consome totalmente a densa floresta da ignorância. Quando o homem compreendeu sua unidade com Brahman, como pode alimentar qualquer semente de nascimento e renascimento?

Quando ocorre a visão da Realidade, o véu da ignorância é removido por completo. Enquanto percebermos as coisas falsamente, nossa falsa percepção nos distrairá e nos fará miseráveis. Quando nossa falsa percepção é corrigida, a miséria chega ao fim.

Por exemplo, vemos uma corda e pensamos que ela é uma cobra. Assim que percebemos que a corda é uma corda, nossa falsa percepção de uma cobra cessa e já não somos perturbados pelo medo que ela inspira. Por isso, o homem sábio que deseja libertar-se de sua servidão deve conhecer a Realidade.

Assim como o ferro produz fagulhas quando está em contato com o fogo, também a mente parece agir e perceber por causa de seu contato com Brahman, que é a própria consciência. Esses poderes de ação e percepção, que parecem pertencer à mente, são irreais. São tão falsos como as coisas vistas na alucinação, na imaginação e no sonho.

As modificações de Maya – que vão da consciência do ego até o corpo e os objetos sensoriais – são todas irreais. São irreais porque mudam de momento em momento. O Atman nunca muda.

O Atman é a consciência suprema, eterna, indivisível e pura, o primeiro sem um segundo. É a testemunha da mente, do intelecto e das outras faculdades. É distinto do corpo denso e do corpo sutil. É o Eu real, o Ser interior, a alegria suprema e eterna.

Assim o homem sábio discerne entre o real e o irreal. Sua visão liberada percebe o Real. Sabendo que seu próprio Atman é a consciência pura e indivisível, ele se liberta da ignorância, da miséria, do poder da distração, e mergulha diretamente na paz.

Quando a visão do Atman, o primeiro sem um segundo, é alcançada através do nirvikalpa samadhi, os laços da ignorância do coração são completamente e para sempre desatados.

“Tu”, “eu”, “isto” – essas idéias de separatividade têm origem na impureza da mente. Mas quando a visão do Atman – o supremo, o absoluto, o um sem um segundo – resplandece no samadhi, toda a consciência de separatividade se desvanece, porque a Realidade foi firmemente apreendida.

Samadhi

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O aspirante espiritual dotado de tranqüilidade, autocontrole, equilíbrio mental e paciência devota-se à prática da contemplação e medita sobre o Atman que habita no seu ser como o Atman que habita em todos os seres. Desse modo, ele aniquila completamente a consciência de separação, que brota das trevas da ignorância, e se regozija na identificação com Brahman, livre dos pensamentos perturbadores e das ocupações egoístas.

Aqueles que repetem os ensinamentos alheios não estão livres do mundo. Mas aqueles que atingiram o samadhi fundindo o universo exterior, os órgãos sensoriais, a mente e o ego na pura consciência do Atman – só eles estão livres do mundo, com seus grilhões e armadilhas.

O Atman único aparece como múltiplo devido à variedade de seus invólucros exteriores. Quando esses invólucros irreais se dissolvem, só o Atman existe. Que o homem sábio, pois, se devote à realização do nirvikalpa samadhi para que os invólucros possam dissipar-se de sua consciência.

Quando o homem ama a Brahman com uma devoção exclusiva e constante, ele se torna Brahman. Por pensar unicamente na vespa, a barata se transforma em vespa.

Assim como a barata se transforma em vespa porque renuncia a qualquer outra atividade e não pensa senão nesse inseto, assim o aspirante espiritual que medita na realidade do Atman converte-se no Atman graças à sua constante devoção.

A verdadeira natureza do Atman é extremamente sutil. Ela não pode ser percebida pela mente densa. Deve ser conhecida no estado de samadhi, que só pode ser alcançado pelas almas nobres cujas mentes se purificaram e que possuem um extraordinário poder de discernimento espiritual.

Assim como o ouro que foi purificado no fogo é expurgado de suas impurezas e restaurado em sua própria natureza, assim a mente, pela meditação, expurga a si mesma das impurezas de sattwa, rajas e tamas e compreende Brahman.

Quando a mente, assim purificada por meio de incessante meditação, se funde com Brahman, o estado de samadhi é atingido. Nesse estado não existe consciência de dualidade. A alegria perene de Brahman é então experimentada.

Quando um homem atinge o samadhi, todos os laços dos desejos são desfeitos e ele se liberta da lei do karma. Brahman lhe é revelado, interior e exteriormente, sempre e em toda parte, sem esforço ulterior de sua parte.

É cem vezes melhor refletir sobre a verdade de Brahman do que meramente informar-se sobre ela nas escrituras. E a meditação é cem vezes melhor do que a reflexão. Mas o nirvikalpa samadhi é infinitamente superior a tudo isso.

No nirvikalpa samadhi – e em nenhum outro estado – a verdadeira natureza de Brahman é clara e definitivamente revelada. Em qualquer outro estado, a mente permanece instável, cheia de pensamentos perturbadores.

Portanto, permanece constantemente absorto na consciência do Atman que habita em teu íntimo. Controla teus sentidos e deixa tua mente tranqüila. Conquista a clara visão de tua unidade com Brahman, destruindo assim a ignorância criada por Maya desde um tempo sem princípio.

Controle interior e exterior

Estes são os primeiros passos no caminho da união com Brahman – controle da linguagem, recusa a aceitar dons desnecessários, abandono das ambições e desejos mundanos, contínua devoção a Brahman.

Sê devotado a Brahman, e serás capaz de controlar os teus sentidos. Controla os teus sentidos, e obterás o domínio sobre a tua mente. Domina a tua mente, e a consciência do ego será dissolvida. Desse modo, o iogue: alcança uma ininterrupta realização da alegria de Brahman. Que aquele que busca se empenhe, pois, em entregar seu coração a Brahman.

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Controla a linguagem pelo esforço mental; controla a mente pela faculdade do discernimento; controla essa faculdade pela vontade individual; mergulha a individualidade no Atman absoluto e infinito e alcança a suprema paz.

O corpo, a energia vital, os órgãos sensoriais, a mente, o intelecto e o ego são os invólucros de Brahman. Quando o homem se identifica com qualquer um desses invólucros, ele assume sua natureza e aspecto.

Quando essa identificação cessa, o homem meditativo se desprende desses invólucros e experimenta perpetuamente a plenitude da eterna alegria.

Desprender-se completamente de todos esses invólucros é possuir tanto a renúncia exterior como a interior. Essa renúncia só pode ser praticada pelo homem dotado de impassibilidade. O homem impassível que aspira à libertação pode praticar tanto a renúncia interior quanto a exterior.

O apego exterior é o apego aos objetos sensoriais. O apego interior é a auto-identificação com o ego e com as modificações da mente. SÓ o homem desapaixonado, ardentemente devotado a Brahman, é capaz de renunciar a ambos.

Conhece, ó sábio, que o homem necessita de impassibilidade: e de discernimento tal como o pássaro necessita de duas asas. Sem eles, o homem não pode atingir o topo da vinha de onde flui o néctar da libertação. Jamais poderá chegar a ele por quaisquer outros meios.

Só o homem dotado de intensa impassibilidade pode alcançar o samadhi. Aquele que alcançou o samadhi vive num estado de constante iluminação. O coração iluminado é libertado da servidão. Só o homem libertado experimenta eterna alegria.

Para o homem dotado de autodomínio, a impassibilidade é a única fonte de felicidade. Se esta estiver combinada com o despertar do puro conhecimento do Atman, o homem torna-se independente de tudo o mais. Esta é a porta para a posse da sempre jovem donzela chamada libertação. Se buscas, pois, o bem supremo, pratica a impassibilidade interior e exterior e conserva uma constante percepção do eterno Atman.

Evita o desejo sensual como um veneno, porque ele é morte. Abandona o orgulho de casta, família e posição social e abstém-te das ações ditadas pelo auto-interesse. Abandona a ilusão de que és o corpo ou qualquer um dos invólucros – todos eles são irreais. Mantém tua mente absorta no Atman. Em verdade, tu és Brahman, a testemunha não agrilhoada pela mente, o um sem um segundo, o supremo.

Fixa a mente em Brahman, a tua meta. Não deixes que os órgãos dos sentidos funcionem externamente; obriga-os a permanecerem em seus respectivos centros. Conserva o corpo ereto e firme. Não te sirvas de nenhum pensamento para a sua manutenção. Devota-te completamente a Brahman e compreende que tu e Brahman são um. Bebe incessantemente a alegria de Brahman. As fontes dessa alegria nunca secam. De que valem as coisas deste mundo? Todas elas são desprovidas de felicidade.

Não permitas que tua mente se compraza em qualquer pensamento que não seja o Atman. Isso é um mal, uma causa de miséria. Medita sobre o Atman, cuja natureza é a bem-aventurança. Este é o caminho da libertação.

O auto-iluminado Atman, a testemunha de todas as coisas, está sempre presente em teu próprio coração. Esse Atman permanece separado de tudo o que é irreal. Conhece-o como sendo tu mesmo e medita sobre ele incessantemente.

Mantém-te em comunhão ininterrupta com o Atman, livre de todos os pensamentos perturbadores. Desse modo alcançarás a convicção de que o Atman é tua verdadeira natureza.

Agarra-te à verdade de que és o Atman. Renuncia a identificar-te com o ego ou com qualquer dos invólucros. Permanece completamente alheio a eles, como se fossem jarros de argila quebrados.

Fixa a mente purificada no Atman, a testemunha, a pura consciência. Empenha-te gradualmente em acalmar tua mente. Então obterás a visão do infinito Atman.

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O um

Medita sobre o Atman como indivisível, infinito, como um éter que a tudo impregna. Compreende que ele é separado do corpo, dos sentidos, da energia vital, da mente e do ego, limitações impostas pela nossa ignorância.

O éter – embora encha centenas de recipientes, como jarros e potes de grãos e arroz, e pareça variado e divisível – é na verdade um, e não muitos. Do mesmo modo o puro Atman, quando libertado das limitações do ego e da mente, é um e apenas um.

Todas as coisas – de Brahma3, o criador, a uma simples folha de erva – são as formas e os nomes aparentemente diversos do Atman único. São simples aparências, e não o real. Medita, pois, sobre o Atman como único e infinito.

O Atman é o princípio e a realidade. Esta aparência de um universo só é vista através da ilusão dos nossos olhos. Quando surge o verdadeiro conhecimento, o Atman é revelado como a própria existência, e o universo aparente não pode ser visto separado dele. Podes confundir uma corda com uma cobra se estiveres iludido. Mas, quando a ilusão cessa, compreendes que a suposta cobra não passava de urna corda. Assim também este universo não é outra coisa senão o Atman.

Eu, o Atman, sou Brahma. Sou Vishnu. Sou Shiva.4 Eu sou o universo. Nada existe, porém eu sou.

Estou no interior; estou no exterior. Estou na frente e atrás. Estou no sul e estou no norte. Estou em cima e estou embaixo.

A onda, a espuma, o redemoinho e a bolha são essencialmente água. Analogamente, o corpo e o ego nada mais são, na verdade, do que pura consciência. Todas as coisas são essencialmente consciência, pureza e alegria.

Todo esse universo a respeito do qual falamos e pensamos nada mais é do que Brahman. Brahman está fora do alcance de Maya. Nada mais existe. Os jarros, os potes e outras vasilhas diferem da argila de que são feitos? O homem bebe o vinho de Maya, fica iludido e começa a ver as coisas como separadas umas das outras, e por isso fala de “tu” e “eu”.

Dizem as escrituras: “O Infinito existe onde não se vê nada mais, não se ouve nada mais, não se sabe nada mais”. No Infinito, dizem-nos as escrituras, não existe dualidade – corrigindo assim a nossa falsa idéia de que a existência é múltipla.

Eu sou Brahman, o supremo, aquele que a tudo impregna, como o éter – imaculado, indivisível, ilimitado, imóvel, imutável. Não tenho interior nem exterior. SÓ eu sou. Sou o primeiro sem um segundo. Que mais existe para ser conhecido?

Que mais há para ser dito? Não sou outro senão Brahman. Brahman é este universo e todas as coisas que nele existem. As escrituras declaram que nada existe fora de Brahman. Os homens iluminados pelo conhecimento de que “Eu sou Brahman” renunciam ao seu apego a este universo aparente. É efetivamente certo que esses iluminados vivem em constante união com Brahman, a consciência pura, bem-aventurada.

Libertação

3 Brahma, um dos membros da trindade hindu, o criador, distinto de Brahman, Deus em seu aspecto impessoal, absoluto. 4 A trindade hindu: Brahma, o criador; Vishnu, o preservador; Shiva, o destruidor.

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Renuncia a todas as esperanças terrenas e a todos os prazeres físicos, cessando de identificar-te com o corpo denso. Em seguida, deves cessar de identificar-te com o corpo sutil. Compreende que és Brahman, cuja forma é eterna bem-aventurança, cujas glórias são declaradas nas escrituras. Desse modo, poderás viver em união com Brahman.

Enquanto amar esse corpo mortal, o homem permanecerá impuro, será ameaçado de todas as maneiras pelos seus inimigos, continuará sujeito ao renascimento, à doença e à morte. Mas se meditar sobre o Atman como a consciência pura e imutável, como a essência do bem, ele se libertará de todos os males. Esta verdade também é confirmada pelas escrituras.

Cessa de identificar-te, erroneamente, com todos aqueles invólucros, como o ego, etc., que recobrem o Atman. Só Brahman permanece – supremo, infinito, imutável, o um sem um segundo.

O mundo fantasma

Quando a mente está completamente absorta no Ser supremo – o Atman, o Brahman, o Absoluto -, o mundo das aparências se desvanece. Sua existência não passa de um mundo vazio.

O mundo das aparências é um mero fantasma; não há senão uma Realidade. Ela é imutável, sem forma e absoluta. Como poderia ser dividida?

Não há nem observador, nem observação, nem coisa observada. Não há senão uma Realidade – imutável, sem forma e absoluta. Como poderia ser dividida?

Não há senão uma Realidade – como um vasto oceano no qual todas as aparências se dissolvem. Ela é imutável, sem forma e absoluta. Como poderia ser dividida?

Nela, as causas da nossa ilusão se desvanecem, tal como as trevas se desvanecem na luz. Ela é suprema, absoluta, o primeiro sem um segundo. Como poderia ser dividida?

Não há senão uma Realidade suprema. Ela é a própria natureza da unidade. Não pode ser dividida em muitos. Se a multiplicidade é real, e não apenas aparente, por que jamais a experimentamos no sono sem sonhos?

O universo deixa de existir depois que despertamos para a suprema consciência no eterno Atman, que é Brahman, desprovido de qualquer distinção ou divisão. Em época alguma – seja no passado, no presente ou no futuro – existe realmente uma cobra dentro de uma corda ou uma gota de água na miragem.

As escrituras declaram que este universo relativo não passa de uma aparência. O Absoluto é não-dual. Também no sono sem sonhos o universo desaparece.

É a nossa ilusão que sobrepõe o universo a Brahman. Mas o sábio sabe que este universo não tem nenhuma realidade separada. Ele é idêntico a Brahman, seu princípio. A corda pode dar a impressão de ser uma cobra, mas a identidade aparente entre a corda e a cobra só dura enquanto persistir a ilusão.

Essa ilusão de identidade tem sua origem na mente densa. Quando a mente é transcendida, ela deixa de existir. Que tua mente, pois, se absorva na contemplação do Atman, a realidade, tua essência íntima.

União com Brahman

Quando a mente alcança a perfeita união com Brahman, o homem sábio compreende Brahman inteiramente no seu coração. Brahman está além de qualquer palavra ou pensamento. É a consciência pura, eterna. É a suprema bem-aventurança. É incomparável e imensurável. E perpetuamente livre, está além de toda ação, é ilimitado como o céu, indivisível e absoluto.

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Quando a mente alcança a perfeita união com Brahman, o homem sábio compreende Brahman inteiramente no seu coração. Brahman está além da causa e do efeito. É a realidade que se encontra além de todo pensamento. É eternamente o mesmo, incomparável, fora do alcance de qualquer concepção mental. Ele é revelado pelas sagradas escrituras e manifesta-se constantemente em nós através da nossa consciência egóica.

Quando a mente alcança a perfeita união com Brahman, o homem sábio compreende Brahman inteiramente no seu coração. Brahman não conhece declínio nem morte. Ele é a Realidade sem começo e sem fim. É como um vasto lençol de água, sereno e sem margens. Está além do jogo das gunas. É o único, o eterno, perpetuamente tranqüilo.

Absorve-te na união com teu verdadeiro Ser e contempla o Atman de infinita glória. Liberta-te da servidão e do cheiro nauseabundo da mundanidade. Empenha-te com tenacidade e alcança a libertação. Desse modo não terás nascido em vão neste mundo.

Medita sobre o Atman, teu verdadeiro Ser, livre de todos os invólucros e limitações e que é a existência, o conhecimento e a bem-aventurança infinitos, o um sem um segundo. Assim te libertarás da roda de nascimento e morte.

Desprendimento

Os efeitos das ações passadas fazem com que o vidente iluminado continue a viver no corpo – mas para ele o corpo é mera aparência, como a sombra de um homem. E, quando abandonar o corpo transformado em cadáver, nunca mais tornará a nascer em outro corpo.

Realiza o Atman, a consciência e a bem-aventurança puras e eternas. Desprende-te completamente desse invólucro, o corpo, que é preguiçoso e imundo. Feito isto, nunca voltes a pensar nele. Lembra-te de que o teu próprio vômito é simplesmente repugnante.

O homem verdadeiramente sábio consome a sua ignorância, com todos os seus efeitos, no fogo de Brahman – o Absoluto, o Eterno, o Eu real. Então ele permanece absorto no conhecimento do Atman, a consciência e a bem-aventurança puras e eternas.

A vaca é indiferente à grinalda colocada em torno de seu pescoço. O conhecedor de Brahman é indiferente ao destino deste corpo, que continua a viver pelo efeito de suas ações passadas. Sua mente está absorta no bem-aventurado Brahman.

O conhecedor de Brahman realizou seu verdadeiro Ser, o Atman, que é alegria infinita. Que motivo ou desejo pode ele ter para apegar-se a esse corpo e alimentá-lo?

Experimentar, em seu próprio coração e no mundo exterior, a bem-aventurança infinita do Atman – tal é a recompensa obtida pelo iogue que atingiu a perfeição e a libertação nesta vida.

Impassibilidade

O fruto da impassibilidade é a iluminação; o fruto da iluminação é o apaziguamento do desejo; o fruto do desejo apaziguado é a experiência da bem-aventurança do Atman, da qual provém a paz.

Os primeiros passos são inúteis quando não se trilha o caminho até o fim. A impassibilidade, a suprema satisfação e a incomparável bem-aventurança devem suceder-se naturalmente, uma à outra.

Sabe-se que o fruto da iluminação é a cessação do sofrimento. Um homem pode cometer muitas más ações por causa de sua ignorância. Mas como pode continuar a fazer o mal quando o discernimento foi despertado em seu ser?

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A iluminação leva o homem a afastar-se do mal e do irreal; o apego a eles resulta da ignorância. Compara o homem que sabe o que é uma miragem com o homem que lhe ignora a natureza. O primeiro se afasta dela; o segundo corre para ela a fim de saciar a sua sede. O homem que alcançou a compreensão já não é atraído pelo mundo das aparências – esta é a sua evidente recompensa.

Quando se desfaz o nó da ignorância do coração, o homem se liberta de todo desejo de objetos materiais. Quando isso ocorre, haverá neste mundo alguma coisa capaz de levá-lo a sentir qualquer apego?

Quando os objetos de prazer deixam de excitar o desejo, alcança-se a perfeita renúncia. Quando a consciência do ego deixa de existir, alcança-se o perfeito conhecimento. Quando a mente está absorta em Brahman e deixa de ser perturbada por qualquer outro pensamento, alcança-se o auto-recolhimento.

O homem que permanece continuamente absorto na consciência de Brahman está livre da tirania do mundo objetivo. Os prazeres que os outros acham tão irresistíveis lhe parecem tão insignificantes quanto o pareceriam a um bebê ou a um homem profundamente adormecido. Quando, por alguns momentos, esse mundo se apresenta à sua consciência, ele o vê como um mundo de sonhos. Ele goza os frutos do mérito infinito. Tal homem é verdadeiramente bem-aventurado e estimado na Terra.

Diz-se que o homem dotado de autodomínio é iluminado quando goza de eterna bem-aventurança. Ele está inteiramente absorto em Brahman, sabe que ele próprio é a Realidade imutável, que está além da ação.

Iluminação

O estado de iluminação é descrito como segue. Há uma consciência ininterrupta da unidade de Atman e Brahman. Não existe mais nenhuma identificação do Atman com seus invólucros. Toda consciência de dualidade é obliterada. Há consciência pura, unificada. O homem que se encontra firmemente instalado nessa consciência é dito iluminado.

Diz-se que um homem está livre já nesta vida quando se instalou na iluminação. Sua bem-aventurança não tem fim. Para ele, este mundo de aparências foi quase esquecido.

Embora sua mente esteja dissolvida em Brahman, ele está plenamente desperto, livre da ignorância da vida no estado de vigília. Está plenamente cônscio, mas livre de qualquer desejo. Tal homem é considerado livre mesmo nesta vida.

Para ele, as tristezas deste mundo terminaram. Embora possua um corpo Finito, ele permanece unido com o Infinito. Seu coração não conhece a ansiedade. Esse homem é considerado livre já nesta vida.

Embora viva no corpo, este lhe parece uma simples sombra que o acompanha. Já não está perturbado pelo pensamento do “eu” e do “meu”. Tais são as características do homem que é livre já nesta vida.

Ele não se preocupa em investigar o passado. Não está interessado em esquadrinhar o futuro. É indiferente ao presente. É assim que podes reconhecer o homem que é livre já nesta vida.

O bem e o mal parecem existir no mundo. Pessoas e objetos parecem distinguir-se entre si. No entanto ele encara tudo do ponto de vista da igualdade, porque vê Brahman em todas as coisas. É assim que podes reconhecer o homem que é livre já nesta vida.

A boa e má fortuna podem advir. Ele encara a ambas com indiferença e permanece insensível a elas. É assim que podes reconhecer o homem que é livre já nesta vida.

Como sua mente está continuamente absorta na bem-aventurança de Brahman, ele é incapaz de distinguir entre o interior e o exterior. É assim que podes reconhecer o homem que é livre já nesta vida.

A vida passa: ele a vê como um espectador desinteressado. Não se identifica com o corpo, os órgãos sensoriais, etc. Está acima da idéia do dever. É assim que podes reconhecer o homem que é livre já nesta vida.

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Pela ajuda das vívidas palavras das Escrituras, ele realizou sua unidade com Brahman. Ele não anseia por renascer. Assim é que podes reconhecer o homem que está livre já nesta vida.

Ele nunca se identifica com o corpo ou com os órgãos dos sentidos. Ele não tem o sentido de posse. Assim é que podes reconhecer o homem que está livre já nesta vida.

Através de sua visão transcendental, ele compreendeu que não há diferença entre o homem e Brahman ou entre Brahman e o universo – pois ele vê que Brahman é tudo. Assim é que podes reconhecer o homem que está livre já nesta vida.

O homem santo pode honrá-lo, o homem mau pode insultá-lo suas reações são as mesmas. Assim é que podes reconhecer o homem que é livre já nesta vida.

Rios deslizam para o oceano, mas o oceano não é perturbado. Os objetos sensoriais fluem pela sua mente, mas ele não sente reação, pois vive na consciência da Realidade una. Ele é verdadeiramente livre, já nesta vida.

A cessação do sonho

Aquele que conheceu a realidade de Brahman não pode continuar apegado a este mundo. Aquele que sente esse apego não conheceu Brahman: continua iludido e limitado pelos sentidos.

De um homem que conheceu Brahman não se pode dizer que ainda está apegado aos objetos sensoriais por causa das fortes impressões e dos velhos hábitos de seus desejos passados. Não – seus desejos e tendências foram varridos porque ele compreendeu sua identidade com Brahman.

Mesmo um homem muito luxurioso não sente desejo algum quando está na presença de sua mãe. Do mesmo modo, o homem se liberta da mundanidade quando compreende Brahman, a infinita bem- aventurança.

As escrituras declaram que mesmo, o homem absorto na meditação está cônscio do mundo exterior, devido às tendências criadas por seu modo de vida anterior. Diz-se que essas tendências continuam a operar nele.

Enquanto o homem experimentar prazer e dor, suas tendências passadas haverão de persistir. Todo efeito é antecedido por uma causa. Onde não existe causa, não existe efeito.

Quando o homem desperta de seu sonho, suas ações oníricas; se desfazem no nada. Quando o homem desperta para o conhecimento de que ele é Brahman, todas as causas acumuladas, todas as ações praticadas ao longo de milhões e milhões de vidas se dissolvem.

Enquanto está dormindo, o homem pode sonhar que está praticando boas ações ou cometendo terríveis pecados. Mas, quando o sonho cessa, como podem essas ações oníricas conduzi-lo ao céu ou ao inferno?

O Atman é eternamente livre, puro e intocável como o éter. Aquele que realizou o Atman jamais será agrilhoado pelas suas ações, sejam elas passadas, presentes ou futuras.

O éter encerrado num cântaro não é afetado pelo cheiro do vinho. O Atman encerrado em seus invólucros não é afetado pelas propriedades desses invólucros.

A flecha não se deterá

O Discípulo:

Entendo que, depois de se alcançar a iluminação, nenhuma ação pode afetar o Atman. Mas, e as ações praticadas antes do despontar do conhecimento? O conhecimento não pode cancelar-lhes os efeitos. A seta atirada contra um alvo não pode ser desviada.

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Suponhamos que confundimos uma vaca com um tigre e lhe desferimos uma flecha. A flecha não se deterá quando descobrirmos que a vaca não é um tigre e atingirá a vaca.

O Mestre:

Sim, tens razão. As ações passadas são muito poderosas, caso já tenham começado a produzir seus efeitos. Elas devem esgotar o seu poder através da experiência atual, mesmo no caso de uma alma iluminada. O fogo do conhecimento destrói toda a acumulação dos karmas presentes e futuros e dos karmas passados que ainda não começaram a produzir seus efeitos. Mas não pode destruir os karmas; passados que já começaram a produzir seus efeitos. No entanto, nenhum desses karmas pode realmente afetar aquele que compreende sua identidade com Brahman e vive continuamente absorto nessa consciência. Tais homens uniram-se a Brahman, o um que está além de todos os atributos.

O vidente vive absorto na consciência do Atman. Ele compreendeu sua identidade com Brahman. Brahman é puro e está livre das qualidades que pertencem aos invólucros denso e sutil. Os karmas passados pertencem a esses invólucros – não podem, pois, afetar o vidente. Quando um homem está desperto, deixa de estar sujeito ao mundo aparente de seus sonhos.

O homem que despertou deixa de identificar-se com seu corpo onírico, com suas ações oníricas ou com os objetos do seu sonho, voltando a si pelo simples despertar.

Ele não tenta afirmar que os objetos do seu sonho são reais nem procura possuí-los. Se continuar a buscar os objetos do mundo onírico, certamente ainda não terá despertado do seu sono.

Do mesmo modo, aquele que despertou para o conhecimento de Brahman vive absorto na união com o eterno Atman. Não vê nada mais. Por certo ele precisa comer, alimentar esse corpo enquanto viver neste mundo. Mas essas ações são praticadas, por assim dizer, de memória. São como as ações que rememoramos de um sonho.

O nascimento num corpo é o resultado do karma. Pode-se dizer, pois, que as ações passadas afetam unicamente o corpo. O Atman não tem princípio. Não se pode dizer que ele nasceu em decorrência do karma. Por isso, é insensato pensar que o karma pode afetar o Atman.

As infalíveis palavras das escrituras declaram que “o Atman é não nascido, eterno, nunca sujeito ao declínio”, Como supor, então, que algum karma afete o homem que vive na consciência do Atman?

As causas acumuladas devido às ações passadas afetam o homem que se identifica com o corpo. A alma iluminada sabe que essa identificação é falsa, e por isso não é afetada por esse karma.

É tolice pensar até mesmo que as causas acumuladas em conseqüência das ações passadas podem afetar o corpo. Como pode esse corpo ser real quando sua existência é meramente ilusória? Como pode uma coisa irreal ter um nascimento? Como pode morrer uma coisa que nunca nasceu? Como podem as ações, os seus efeitos, afetar o que é irreal?

Quando desponta o conhecimento, a ignorância e seus efeitos desaparecem. O homem ignorante pode perguntar: “Se assim é, como pode o corpo de uma alma iluminada continuar a existir?” Mas quando as escrituras dizem que a continuidade do corpo é causada pelas ações passadas, elas estão simplesmente explicando as coisas de um modo que o ignorante possa entender. Não estão querendo provar a realidade do corpo e dos demais invólucros do ponto de vista de uma alma iluminada.

Brahman é tudo

Do ponto de vista da alma iluminada, Brahman está em todas as coisas – sem princípio, sem fim, imensurável, imutável, o primeiro sem um segundo. Em Brahman não há diversidade.

Brahman é pura existência, pura consciência, eterna bem-aventurança, está além da ação, é o primeiro sem um segundo. Em Brahman não há diversidade.

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Brahman é a consciência recôndita, repleta de bem-aventurança, infinita, onipresente, o primeiro sem um segundo. Em Brahman não há diversidade.

Brahman não pode ser evitado, já que está em toda parte. Brahman não pode ser apreendido, já que é transcendente. Não pode ser encerrado, já que encerra todas as coisas. Ele é o primeiro sem um segundo. Em Brahman não há diversidade.

Brahman é sem parte e sem atributos. É sutil, absoluto, imaculado, o um sem um segundo. Em Brahman não há diversidade.

Brahman é indefinível, está fora do alcance da mente e da palavra, é o primeiro sem um segundo. Em Brahman não há diversidade.

Brahman é a própria realidade; instalado na sua própria glória; pura, absoluta consciência, sem igual, o primeiro sem um segundo. Em Brahman não há diversidade.

Os aspirantes espirituais, as almas magnânimas que se libertaram de todos os desejos, recusando todos os prazeres sensuais, serenas e autocontroladas – compreendem esta suprema verdade de Brahman. Tais almas realizam a união com Brahman e alcançam a suprema bem-aventurança.

Tu também deves discernir e compreender a suprema verdade de Brahman. Compreende a verdadeira natureza do Atman como a totalidade de toda a bem-aventurança. Desembaraça-te das ilusões criadas por tua própria mente. Desse modo, te tomarás livre e iluminado e alcançarás a bem-aventurança.

Tranqüiliza tua mente por inteiro e atinge o samadhi. Então terás a visão desanuviada, discernindo claramente a verdade do Atman. Dos lábios de teu mestre aprendeste a verdade de Brahman tal como ela é revelada nas escrituras. Deves agora compreender essa verdade de maneira direta e imediata. Só então teu coração estará livre de qualquer dúvida.

Como podes saber, com certeza, que estás libertado da servidão da ignorância e compreendeste o Atman, que é existência absoluta, pura consciência e eterna bem-aventurança? As palavras das escrituras, o teu próprio poder de raciocínio e o ensinamento do teu mestre podem ajudar a convencer-te – mas a única prova absoluta é a experiência direta e imediata na tua própria alma.

Servidão e libertação, contentamento e ansiedade, doença e saúde renovada, fome e assim por diante – tudo isso são coisas da experiência pessoal. Conheces a ti mesmo. Os outros só podem conjeturar sobre a tua condição.

Os mestres e as escrituras podem estimular a percepção espiritual. Mas o discípulo sábio atravessa o oceano da sua ignorância pela iluminação direta, pela graça de Deus.

Obtém a experiência diretamente. Realiza Deus por ti mesmo. Conhece o Atman como o Ser uno e indivisível e toma-te perfeito. Liberta a tua mente de todas as perturbações e absorve-te na consciência do Atman.

Esta é a declaração final do Vedanta: Brahman é tudo – este universo e cada criatura. Estar liberto é viver em Brahman, a realidade indivisa. Brahman é o um sem um segundo, como testemunham as escrituras.

O discípulo se rejubila

O discípulo ouviu atentamente as palavras do mestre. Aprendeu a suprema verdade do Brahman, da qual as escrituras dão testemunho e que é confirmada com a ajuda de seus próprios poderes de raciocínio. Então ele afastou seus sentidos do mundo objetivo e concentrou sua mente no Atman. Seu corpo parecia tão imóvel quanto uma rocha.

Sua mente estava totalmente absorta em Brahman. Pouco depois ele voltou à consciência normal. Então, na plenitude de sua alegria, ele falou:

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O ego desapareceu. Compreendi a minha identidade com Brahman e assim todos os meus desejos se desvaneceram. Ergui-me acima de minha ignorância e do meu conhecimento deste universo aparente. Que alegria é esta que eu sinto? Quem poderá medi-la? Tudo o que sinto é uma alegria ilimitada, infinita.

O oceano de Brahman está cheio de néctar – a alegria do Atman. O tesouro que nele encontrei não pode ser descrito em palavras. A mente é incapaz de concebê-lo. Minha mente caiu como pedra de granizo na vasta superfície do oceano de Brahman. Ao tocar uma gota dele, dissolvi-me e tomei-me um com Brahman. E agora, embora de volta à humana consciência, eu vivo na alegria do Atman.

Onde está este universo? Quem o arrebatou? Ter-se-á fundido com outra coisa? Ainda há pouco eu o contemplava – agora ele não mais existe. É deveras maravilhoso!

Eis o oceano de Brahman, cheio de alegria infinita. Como posso aceitar ou rejeitar alguma coisa? Existe alguma coisa separada ou distinta de Brahman?

Agora, finalmente e com clareza, eu sei que sou o Atman, cuja natureza é eterna alegria. Nada vejo, nada ouço, nada conheço que esteja separado de mim.

Curvo-me ante vós, ó grande alma, meu mestre! Estais livre de todo apego, sois o maior dentre os homens sábios e bons. Sois a personificação da eterna bem-aventurança. Vossa compaixão é infinita, um mar sem praias.

Vossos olhos são cheios de misericórdia. Um olhar deles é como uma torrente de raios de luar que alivia o cansaço da minha mortalidade e a dor da minha servidão ao nascimento e à morte. Num instante, pela vossa graça, encontrei esse tesouro inexaurível, indiviso – o Atman, o eterno bem-aventurado.

Estou feliz! Realizei o propósito único da vida. O dragão do renascimento nunca mais tornará a arrebatar- me. O Infinito me pertence. Reconheço a minha verdadeira natureza com eterna alegria. E tudo isso graças à vossa misericórdia!

Nada me prende a este mundo. Já não me identifico com o corpo físico nem com a mente. Sou um com o Atman, o imortal! Eu sou o Atman – infinito, puro, eterno, perpetuamente em paz.

Não sou nem o que age nem o que sofre as conseqüências da ação. Estou além da ação e sou imutável. Minha natureza é pura consciência. Sou a realidade absoluta, a eterna bondade.

Não sou eu quem vê, ouve, fala, age, sofre ou goza. Eu sou o Atman eterno, imortal, para além da ação, ilimitado, livre – nada mais que pura, infinita consciência.

Não sou nem este nem aquele objeto. Sou Aquele que toma manifestos todos os objetos. Sou supremo, eternamente puro. Não estou nem dentro nem fora. Sou o infinito Brahman, o primeiro sem um segundo.

Eu sou a Realidade sem princípio, incomparável. Não participo da ilusão do “eu“ e do “tu”, do “isto” e do “isso”. Eu sou Brahman, o um sem um segundo, a bem-aventurança infinita, a Verdade eterna, imutável.

Sou o Senhor e o refúgio de todas as coisas. Sou o destruidor de todos os pecados e impurezas. Sou pura e indivisível consciência. Sou a testemunha de todas as coisas. Não tenho outro senhor além de mim mesmo. Sou livre do significado do “eu” e do “meu”.

Estou em todos os seres como o Atman, a pura consciência, o princípio de todos os fenômenos, internos e externos. Sou ao mesmo tempo o fruidor e a coisa usufruída. Nos dias de minha ignorância, costumava pensar nessas coisas como separadas de mim mesmo. Agora sei que eu sou Tudo.

Em mim está o oceano da alegria, infinito, indiviso. O vento de Maya sopra sobre ele, criando e dissolvendo as aparências deste mundo, como ondas.

Tomando a aparência pela realidade, as pessoas imaginam, em sua ignorância, que estou encerrado numa forma corporal e mental. Do mesmo modo, imaginam que o Tempo, que é indivisível e contínuo, está dividido em ciclos, anos e estações.

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Mas, não importa o que a imaginação dos tolos iludidos e ignorantes possa sobrepor à Realidade, a Realidade permanece imaculada. A miragem do grande rio não pode molhar as areias do deserto.

Como o éter, não posso ser contaminado. Como o sol, sou diferente dos objetos que revelo. Como a montanha, permaneço imóvel. Como o oceano, sou ilimitado.

O céu não é confinado pelas suas nuvens. Eu não sou confinado pelo corpo. Como, pois, posso ser afetado pelos estados de vigília, de sonho e de sono sem sonhos, meras condições corporais?

Minha forma exterior vem e vai. Ela age e prova os frutos de suas ações, definha e morre. Mas eu permaneço, como uma grande montanha, firme e imóvel para sempre.

Não conheço nem o desejo, nem o fim do desejo – porque sou sempre o mesmo, incapaz de divisão. Como pode qualquer ação ser possível para aquele que é eterno, universal e infinito como o céu? Em que deveria ele empenhar-se?

Sou desprovido de órgãos, de forma e de mente. Sou alheio à mudança. Sou a consciência pura, indivisa. Como posso imiscuir-me na ação, seja ela justa ou iníqua? Por isso as escrituras declaram que “o Atman permanece igualmente alheio ao bem e ao mal”.

O homem é diferente da sua sombra. Não importa o que essa sombra venha a tocar – quente ou frio, bom ou mau -, ele permanece completamente intacto.

As propriedades dos objetos observados não afetam a testemunha que se mantém separada deles, sem apego. Do mesmo modo, as propriedades de um aposento não afetam a lâmpada que as revela.

O sol testemunha as ações, mas é distinto delas. O fogo queima todas as coisas, mas é distinto delas. A corda é confundida com urna cobra, mas continua sendo uma corda. Do mesmo modo eu – o imutável Atman, a pura consciência – sou distinto desta for-ma aparente.

Eu não ajo nem faço os outros agirem, não experimento nem faço os outros experimentarem, não vejo nem faço os outros verem. Eu sou o Atman, auto-iluminado, transcendente.

O sol se reflete na água. A água se move e o tolo pensa que o sol está se movendo. O Atman se reflete nos corpos físico e mental. Os corpos se movem e agem, e o tolo pensa: “Eu ajo, eu experimento, eu sou assassinado.”

O corpo pode cair morto na água ou na terra. Eu não sou afetado por isso. O éter contido num jarro não é afetado quando o jarro se quebra.

Agir ou gozar, ser obtuso ou astuto ou embriagado, ser livre ou escravo – tudo isso são condições transitórias do intelecto. Elas nada têm a ver com o Atman, que é Brahman, o absoluto, o um sem um segundo. Quer Maya passe por dez, cem ou mil transformações – que têm elas a ver comigo, se não participo delas? Uma nuvem pode manchar o céu?

Todo este universo – de Maya até as formas físicas exteriores – é visto como mera sombra de Brahman. Eu sou esse Brahman, o primeiro sem um segundo, sutil como o éter, sem princípio nem fim.

Eu sou esse Brahman, o primeiro sem um segundo, o princípio de todas as existências. Tomo manifestas todas as coisas. Dou forma a todas as coisas. Estou em todas as coisas, mas nada pode afetar-me. Sou eterno, puro, imutável, absoluto.

Eu sou esse Brahman, o primeiro sem um segundo. Maya, a de múltiplos aspectos, está fundida em mim. Estou fora do alcance do pensamento, sou a essência de todas as coisas. Eu sou a verdade. Sou o conhecimento. Sou infinito. Sou a bem-aventurança absoluta.

Estou além da ação, sou a realidade imutável. Não tenho partes nem forma. Sou absoluto. Sou eterno. Nada me sustenta, eu me sustento a mim mesmo. Sou o primeiro sem um segundo.

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Eu sou a alma do universo. Sou todas as coisas e estou acima de todas as coisas. Sou o primeiro sem um segundo. Sou pura consciência, única e universal. Sou alegria. Sou vida eterna.

Mais uma vez vos saúdo, nobilíssimo senhor, meu mestre. Pela suprema majestade da vossa graça, eu atingi este abençoado estado. Sou soberano do reino de mim mesmo.

Até agora estive sonhando. No meu sonho, vaguei pela floresta da ilusão, de um nascimento a outro, assediado por todos os tipos de atribulações e misérias, sujeito à reencarnação, ao declínio e à morte. O tigre do ego atacou-me cruelmente, sem cessar. Agora, pela vossa infinita compaixão, ó mestre, acordastes-me do meu sonho. Libertastes-me para sempre.

Saúdo-vos, ó grande mestre. Vós sois uno com Brahman. Sois uno com a fúlgida Luz que dissipa as sombras deste mundo.

A jóia suprema

O digno discípulo encontrou a alegria do Atman no samadhi e despertou para sempre para a consciência da Realidade. Agora ele se prostra diante do seu grande mestre. O mestre, infimamente jubiloso, torna a falar- lhe com as seguintes palavras memoráveis:

Nossa percepção do universo é uma contínua percepção de Brahman, embora o homem ignorante não esteja consciente disso. Em verdade, este universo não é outra coisa senão Brahman. Vê Brahman em toda parte, sob todas as circunstâncias, com o olho do espírito e o coração tranqüilo. Como podem os olhos físicos ver alguma coisa mais que os objetos físicos? Como pode a mente do homem iluminado pensar em alguma coisa que não seja a Realidade?

Como pode um homem sábio rejeitar a experiência da suprema bem-aventurança e deleitar-se com as meras formas exteriores? Quando a lua brilha com sua sublime beleza, quem pensaria em olhar para uma lua pintada?

A experiência do irreal não nos oferece nenhuma satisfação nem uma fuga da miséria. Encontra, pois, satisfação na experiência da doce bem-aventurança de Brahman. Devota-te ao Atman e vive feliz para sempre.

Ó nobre alma, assim deves passar os teus dias – vê o Atman em toda parte, goza a bem-aventurança do Atman, fixa teu pensamento no Atman, o primeiro sem um segundo.

O Atman é uno, absoluto, indivisível. É pura consciência. Imaginar nele formas múltiplas é como imaginar castelos no ar. Sabe, pois, que és o Atman, o eterno bem-aventurado, o primeiro sem um segundo, e encontra a paz final. Permanece absorto na alegria que é silêncio.

Esse estado de silêncio é o estado de paz total, na qual o intelecto deixa de ocupar-se com o irreal. Nesse silêncio, a grande alma que conhece, e é una com Brahman, goza de pura e eterna bem-aventurança.

Para o homem que compreendeu o Atman como seu verdadeiro ser e que experimentou a bem- aventurança íntima do Atman, não existe alegria mais excelente do que esse estado de silêncio no qual todos os desejos são mudos.

Não importa o que esteja fazendo – andando, de pé, sentado ou deitado -, o vidente iluminado cujo deleite é o Atman vive na alegria e na liberdade.

Quando uma grande alma encontrou a perfeita tranqüilidade pela libertação da sua mente de todos os pensamentos perturbadores e pela completa realização de Brahman, então ela já não necessita de lugares sagrados, disciplinas morais, horas fixas, posturas, instruções ou objetos para a sua meditação. Seu conhecimento do Atman não depende de circunstâncias ou condições especiais.

Para se saber que um jarro é um jarro são requeridas; condições especiais? Basta que o nosso meio de percepção, os olhos, esteja livre de defeito. Isso basta para revelar o objeto.

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O Atman está eternamente presente. É revelado pela experiência transcendental, que não depende de lugar, de tempo ou de rituais de autopurificação.

Não preciso de nenhuma condição ou prova especial para saber que meu nome é Devadatta. Analogamente, para um conhecedor de Brahman, o conhecimento de que “eu sou Brahman” não requer nenhuma prova.

O Atman, brilhando com sua própria luz, causa este universo aparente. Mas como pode alguma coisa neste universo revelar o Atman? Fora do Atman, essas aparências são desprezíveis, incorpóreas, irreais.

Os Vedas, os Puranas, todas as escrituras e todas as criaturas vivas só existem porque o Atman existe. Como pode, pois, qualquer um deles revelar o Atman, que é o revelador de todas as coisas?

O Atman brilha com sua própria luz. Seu poder é infinito. Está além do conhecimento dos sentidos. É a fonte de toda experiência. Aquele que conhece o Atman está livre de todos os tipos de servidão. É cheio de glória. É o maior dentre os maiores.

As coisas percebidas pelos sentidos não lhe causam dor nem prazer. Não está apegado a elas, nem tampouco as evita. Deleitando-se constantemente no Atman, está sempre brincando no seu íntimo. Ele experimenta a doce, eterna bem-aventurança do Atman e sente-se satisfeito.

A criança brinca com seus brinquedos e se esquece até da fome e da dor física. De maneira análoga, o conhecedor de Brahman tira seu deleite do Atman e se esquece de todo pensamento do “eu” e do “meu”.

Ele obtém seu alimento facilmente, pedindo esmolas, sem cuidados nem ansiedades. Bebe no riacho límpido. Vive livre e independente. Dorme sem medo na floresta ou no chão de cremação. Não precisa lavar e secar suas roupas, porque não as usa. A terra é a sua cama. Ele bilha o caminho do Vedanta. Seu companheiro é Brahman, o eterno.

O conhecedor do Atman não se identifica com seu corpo. Permanece dentro dele como dentro de uma carruagem. Se as pessoas lhes oferecem confortos e luxos, desfruta-os e brinca com eles como uma criança. Não traz sinais exteriores de um homem santo. Permanece perfeitamente desapegado das coisas deste mundo.

Pode usar roupas caras ou nenhuma roupa. Pode vestir-se com pele de gamo ou de tigre, ou com puro conhecimento. Pode parecer um louco, ou uma criança, ou às vezes um espírito impuro. Assim ele vagueia pela Terra.

O homem contemplativo caminha sozinho. Vive sem desejo no meio dos objetos de desejo. O Atman é a sua eterna satisfação. Ele vê o Atman presente em todas as coisas.

Às vezes ele parece um néscio, às vezes, um sábio. Às vezes parece esplêndido como um rei, às vezes um imbecil. Às vezes é calmo e calado. Às vezes atrai os homens a si, tal como uma píton atrai a sua presa. Às vezes as pessoas o veneram, às vezes o insultam. Às vezes o ignoram. Assim vive a alma iluminada, sempre absorta na suprema bem-aventurança.

Tal homem não tem riquezas, mas está sempre contente. É desamparado, mas dotado de grande poder. Não usufrui nada, mas está sempre se regozijando. Não tem igual, mas vê a todos os homens como seus iguais.

Ele age, mas não é limitado pela ação. Colhe os frutos das ações passadas, mas não é afetado por eles. Tem um corpo, mas não se identifica com ele. Parece ser um indivíduo, mas está presente em todas as coisas, em toda parte.

O conhecedor de Brahman, que vive livre da consciência corporal, nunca é atingido pelo prazer ou pela dor, pelo bem ou pelo mal.

Se o homem se identificar com os invólucros densos e sutis dentro dos quais habita, experimentará o prazer e a dor, o bom e o ruim. Mas nada é bom ou ruim para o sábio contemplativo, porque ele compreendeu o Atman. e seus grilhões caíram por terra.
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Durante um eclipse solar, o sol é encoberto pela lua. O ignorante, que não entende o que aconteceu, diz que o sol foi tragado por um demônio – mas o sol nunca pode ser tragado.

Do mesmo modo, o ignorante vê o corpo de um conhecedor de Brahman e identifica-o com ele. Em verdade, ele está livre do corpo e de qualquer outro tipo de servidão. Para ele, o corpo não passa de uma sombra.

Ele habita no corpo, mas o vê como coisa separada dele – como a pele abandonada de uma cobra. O corpo se move de lá para cá, impelido pela força vital.

Uma tora é carregada pelo rio para um lugar mais baixo ou mais alto. O corpo do conhecedor de Brahman, carregado pelo rio do tempo, goza ou sofre os efeitos das ações passadas.

Em vidas passadas, enquanto ainda permanecia na ignorância, ele criou certos karmas. Na vida atual, ele aparentemente goza ou sofre os seus efeitos. Mas agora ele alcançou a iluminação e não se identifica mais com o corpo. Seu corpo se move entre objetos externos e ele parece gozar ou sofrer os efeitos das ações passadas – tal como um homem que continua ignorante. Na verdade, porém, ele vive em Brahman e só habita o corpo como um espectador sereno, desprendido. Sua mente está livre de toda perturbação e mantém-se impassível, como o eixo de urna roda.

Ele não dirige seus sentidos para os objetos exteriores nem os retira. Permanece como um espectador, indiferente. Não deseja a recompensa de suas ações, porque está inebriado pelo Atman – o néctar da pura alegria.

Aquele que renuncia à busca de qualquer objetivo, seja neste mundo ou mesmo no céu, e permanece absorto no Atman, é na verdade o próprio Deus Shiva. É o excelente conhecedor de Brahman.

Embora habite no corpo, é eternamente livre. Atingiu a meta abençoada. É o excelente conhecedor de Brahman. Quando o corpo o abandona, ele se funde com Brahman, o um sem um segundo.

Todo ator é sempre a mesma pessoa, mesmo quando vestido para desempenhar um papel. O excelente conhecedor de Brahman; é sempre Brahman, e nada mais.

Quando uma alma iluminada alcançou a unidade com Brahman, seu corpo pode definhar e cair em qualquer lugar, como a folha murcha de uma árvore. Que importa? Porque ele já se libertou da consciência corporal, consumindo-a no fogo do conhecimento.

A alma iluminada vive eternamente cônscia de sua unidade com Brahman, o primeiro sem um segundo. Ao despojar-se dessa roupagem de pele, carne e osso, ela não precisa considerar se o lugar, a época e as circunstâncias são apropriados.

Estar livre do corpo não é libertação. Tampouco, um homem é libertado por formas exteriores de renúncia. A libertação consiste em desfazer o nó da ignorância no coração.

Uma árvore ganha ou perde alguma coisa porque sua folha cai num fosso e não num rio, ou num terreno sagrado em vez de num campo aberto?

A destruição do corpo, dos órgãos sensoriais, da respiração vital e do cérebro é como a destruição de uma folha, de uma flor ou de um fruto. Porém o Atman, como a árvore, permanece de pé. O Atman não é afetado – ele é o Eu real, o verdadeiro Ser, a personificação da alegria.

As escrituras definem o Atman como “pura consciência” mostrando assim que ele é a eterna verdade. SÓ os invólucros exteriores morrem. Eles são feitos de ignorância e ocultam o Atman.

“Na verdade”, dizem as escrituras, “O Atman é imortal”, mostrando assim que ele permanece indestrutível entre as coisas que mudam e perecem.

Pedras, árvores, relva, grãos, palha, roupa e todas as outras substâncias, quando queimadas, são reduzidas a cinza. O corpo, os sentidos, as forças vitais, a mente e todas as outras manifestações físicas, quando consumidas pelo fogo do conhecimento, tornam-se Brahman.
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A escuridão se funde na luz do sol, o seu oposto. Do mesmo modo, este mundo aparente se funde em Brahman.

Quando se quebra o jarro, o éter que está dentro dele torna-se uno com o éter circundante. Quando os invólucros são destruídos, o conhecedor de Brahman toma-se Brahman.

Quando se despeja leite no leite, óleo no óleo, água na água, eles se misturam em absoluta unidade. Do mesmo modo, o vidente iluminado, o conhecedor do Atman, toma-se uno com o Atman.

Aquele que se libertou nesta vida alcança a libertação na morte e une-se eternamente com Brahman, a Realidade Absoluta. Esse vidente jamais renascerá.

Ele sabe que é uno com Brahman e consumiu os invólucros da ignorância no fogo desse conhecimento. Assim, ele se tomou Brahman. Como pode Brahman estar sujeito ao nascimento?

Analogamente, tanto a servidão como a libertação são invenções da nossa ignorância. Elas não existem realmente no Atman, tal como um pedaço de corda continua sendo corda, quer o confundamos ou não com uma cobra. A suposta cobra não existe realmente na corda.

As pessoas falam de servidão e libertação – referindo-se à presença ou à ausência do véu da ignorância. Mas, na realidade, Brahman não tem invólucro. Porque não existe outro senão Brahman – o primeiro sem um segundo. Se houvesse um invólucro, Brahman não seria único. As escrituras não admitem dualidade.

Servidão e libertação existem apenas na mente, mas o ignorante as atribui falsamente ao próprio Atman – da mesma forma que afirmam estar o sol escurecido quando ele está apenas coberto por uma nuvem. Mas Brahman, o primeiro sem um segundo, a realidade imutável, permanece independente. Ele é pura consciência.

Imaginar que o Atman pode ser escravizado ou libertado é falso. Tanto a servidão como a libertação são estados mentais. Nenhum deles pode ser atribuído a Brahman, a realidade eterna.

Por conseguinte, tanto a servidão como a libertação são ficções da ignorância. Elas não estão no Atman. O Atman é infinito, sem partes, está além da ação. É sereno, imaculado, puro. Como imaginar a dualidade em Brahman, que é inteiro como o éter, sem um segundo a realidade suprema?

Não existe nem nascimento nem morte, nem alma limitada ou excelsa, nem alma libertada ou em busca da libertação – esta é a verdade final e absoluta.

Revelei-te hoje o supremo mistério. Esta é a mais recôndita essência de todo o Vedanta, a jóia suprema de todas as escrituras. Considero-te o meu próprio filho – um verdadeiro aspirante à libertação. Estás purificado de todas as máculas desta época de trevas e tua mente está livre do desejo.

Ao ouvir estas palavras de seu mestre, o discípulo prostrou-se diante dele com o coração reverente. Depois, com a bênção do mestre, seguiu seu caminho, livre da servidão da ignorância.

O mestre também seguiu seu caminho, levando pureza a todo o mundo, com a mente imersa no oceano da existência e da alegria absolutas.

Neste diálogo entre mestre e discípulo, a verdadeira natureza do Atman foi exposta de modo que os aspirantes à libertação a compreendam facilmente.

Possam os aspirantes espirituais à libertação, que se desembaraçaram de todas as impurezas do coração pela prática de obras altruísticas, que são avessos aos prazeres mundanos, que se deleitam nas palavras das escrituras, cujas mentes entraram na paz – possam eles acolher hospitaleiramente estes ensinamentos salutares!

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E àqueles que por ignorância vagueiam no deserto deste mundo, trilhando o círculo da morte e do renascimento, cansados, sedentos e oprimidos pela causticante miséria como pelos raios abrasadores do sol – possam estes ensinamentos revelar Brahman, o primeiro sem um segundo, o doador de deleites, o oceano de néctar que se espraia diante de nossos próprios pés. Que estes ensinamentos de Shankara coroem de êxito os seus esforços e os conduzam à libertação.

Om… Paz – Paz – Paz.

IV
Shankara formula e responde a algumas importantes perguntas

Prasna-Uttara-Malika “Florilégio de perguntas e respostas”

Qual a melhor coisa que um aspirante espiritual pode fazer?

Cumprir as instruções do seu guru.

O que deve ser evitado?

As ações que nos levam a uma maior ignorância da verdade.

Quem é o guru?

O que encontrou a verdade de Brahman e está constantemente interessado na felicidade de seus discípulos.

Qual é o primeiro e mais importante dever do homem possuidor da reta compreensão?

Libertar-se dos grilhões do desejo mundano.

Como se pode alcançar a libertação?

Pela obtenção do conhecimento de Brahman-

Quem, neste mundo, pode ser chamado de puro?

Aquele cuja mente é pura.

Quem pode ser chamado de sábio?

Aquele que pode discernir entre o real e o irreal.

O que envenena o aspirante espiritual?

A negligência dos ensinamentos de seu guru.

Para aquele que alcançou o nascimento humano, qual é o objetivo mais desejável?

Compreender aquilo que é o seu maior bem e estar constante-mente empenhado em fazer o bem aos outros.

O que ilude um homem como uma bebida inebriante?

O apego aos objetos dos sentidos.

Quem são os ladrões?

Os objetos que roubam a verdade de nossos corações.

O que causa a servidão do desejo mundano?

A ânsia de gozar esses objetos.

Qual é o obstáculo ao crescimento espiritual?

A preguiça.

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Qual a melhor arma para subjugar os outros?

O raciocínio correto.

Onde reside a força?

Na paciência.

Onde está o veneno?

No coração dos maus.

Que é o destemor?

A impassibilidade.

O que mais se deve temer?

Ser possuído pela sua própria riqueza.

O que é mais raro de encontrar na humanidade?

O amor a Deus.

Quais são os males mais difíceis de extirpar?

O ciúme e a inveja.

Quem é caro a Deus?

Aquele que é destemido e ajuda os outros a se libertarem do medo.

Como se atinge a libertação?

Pela prática das disciplinas espirituais.

Quem é mais digno de louvor?

O conhecedor de Brahman.

Como se desenvolve o poder de discernimento?

Pelo serviço a um ancião.

Quem são os anciãos?

Aqueles que compreenderam a verdade fundamental.

Quem é realmente rico?

Aquele que adora a Deus com devoção.

Quem tira proveito da vida?

O homem humilde.

Quem é o perdedor?

Aquele que é orgulhoso.

Qual é a tarefa mais difícil para um homem?

Manter sua mente sob constante controle.

Quem protege um aspirante?

O seu guru.

Quem é o mestre deste mundo?

Deus.

Como se alcança a sabedoria?

Pela graça de Deus.

Como se alcança a liberdade?

Pela devoção a Deus.

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Quem é Deus?

Aquele que nos afasta da ignorância.

Que é ignorância?

O obstáculo à revelação do Divino que está dentro de nós.

Qual é a Realidade suprema?

Brahman.

O que é irreal?

Aquilo que desaparece quando o conhecimento desperta.

Há quanto tempo existe a ignorância?

Desde sempre.

O que é inevitável?

A morte do corpo.

A quem devemos adorar?

A uma encarnação de Deus.

O que é libertação?

A destruição da nossa ignorância.

Em quem não se deve confiar?

Naquele que tem o hábito de mentir.

Qual é a força de um homem santo?

Ele confia em Deus.

Quem é o homem santo?

Aquele que é para sempre bem-aventurado.

Quem é livre do pecado?

Aquele que entoa o nome de Deus.

Qual é a fonte de todas as escrituras?

A sagrada sílaba OM.

Que é que nos transporta através do oceano do mundo?

Os lótus de Deus; eles nos transportam como um grande navio.

Quem é escravo?

Aquele que está apegado ao mundo.

Quem é livre?

Aquele que é desapaixonado.

Como é o céu que alcançamos?

O céu que alcançamos é o estado em que estamos livres dos desejos.

Que é que destrói o desejo?

A compreensão de nosso verdadeiro Eu.

Qual é a porta para o inferno?

A luxúria.

Quem vive imerso na felicidade?

Aquele que alcançou o samadhi.

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Quem está desperto?

Aquele que discerne entre o certo e o errado.

Quais são os nossos inimigos?

Nossos órgãos sensoriais, quando não são controlados.

Quais são os nossos amigos?

Nossos órgãos sensoriais, quando são controlados.

Quem é pobre?

Aquele que é ávido.

Quem é totalmente cego?

Aquele que é lascivo.

Quem venceu o mundo?

Aquele que conquistou a própria mente.

Quais são os deveres de um aspirante espiritual?

Andar em companhia do sagrado, renunciar a todos os pensamentos do “eu” e do “meu”, devotar-se a Deus.

De quem o nascimento é abençoado?

Daquele que não precisa renascer.

Quem é imortal?

Aquele que não precisa passar por outra morte.

Quando é que um homem está firmado no ideal da renúncia?

Quando sabe que Atman e Brahman são um.

Qual é a ação correta?

A ação que agrada a Deus.

Neste mundo, qual é o maior terror?

O medo da morte.

Quem é o maior herói?

Aquele que não é aterrorizado pelas setas lançadas pelos olhos de uma bela mulher.

Quem é pobre?

Aquele que não está contente.

Que é mesquinharia?

Pedir a alguém que tem menos do que nós.

A quem devemos honrar?

Àquele que nada pede a ninguém.

Quem, neste mundo, está verdadeiramente vivo?

Aquele cujo caráter está isento de defeito.

Quem está desperto?

Aquele que pratica o discernimento.

Quem está dormindo?

Aquele que vive na ignorância.

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O que rola rapidamente, como gotas de água de uma folha de lótus?

A juventude, a riqueza e os anos da vida de um homem.

Quem é considerado tão puro como os raios da lua?

O homem santo.

Que é o inferno?

Viver escravizado aos outros.

Que é a felicidade?

O desprendimento.

Qual é o dever do homem?

Fazer o bem a todos os seres.

Quais são as coisas desprezíveis desde o momento em que são obtidas?

O prestígio e a fama.

O que é que traz a felicidade?

A amizade do sagrado.

O que é a morte?

Ignorância.

Qual é a coisa mais valiosa?

Uma dádiva concedida na hora certa.

Que doença se prolonga até o homem morrer?

A má ação que se procurou esconder.

Em que devemos empenhar-nos?

Em continuar aprendendo enquanto vivemos.

O que devemos abominar?

Cobiçar as viúvas e as riquezas de outros homens.

No que o homem deve pensar dia e noite?

Na transitoriedade deste mundo. Ele nunca deve acalentar pensamentos de luxúria.

Que coisa é mais digna de apreço?

A compaixão e a amizade com o sagrado.

Que coração não conseguireis conquistar, mesmo se o tentardes com todas as vossas forças?

O coração de um tolo ou de um homem que tem medo, ou está cheio de mágoa, ou é incapaz de gratidão.

Quem pode evitar as armadilhas do mundo?

Aquele que é sincero e capaz de permanecer impassível diante do prazer e da dor e de todos os outros pares de opostos da vida.

A quem os próprios deuses prestam homenagem?

Àquele que é compassivo.

A quem todos o homens respeitam?

Àquele que é humilde e fala a verdade, de um modo que faz o bem aos outros e os toma felizes.

Quem é cego?

Aquele que comete más ações.

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Quem é surdo?

Aquele que não ouve o bom conselho.

Quem é mudo?

Aquele que não diz palavras amáveis quando elas são necessárias.

Quem é um amigo?

Aquele que impede seu próximo de fazer o mal.

Qual é o melhor ornamento do homem?

O bom caráter.

Que é que termina tão depressa quanto o relâmpago?

A amizade com homens ou mulheres maus.

Quais são as qualidades mais raras neste mundo?

Ter o dom de dizer palavras doces com compaixão, ser erudito sem orgulho, ser heróico e ao mesmo tempo generoso, ser rico sem apego à riqueza – estas quatro qualidades são raras.

O que deve ser mais deplorado?

A avareza na opulência.

O que deve ser louvado?

A generosidade.

Quem é reverenciado pelos sábios?

Aquele que é humilde.

Quem conquista a glória para toda a sua família?

Aquele que permanece humilde quando dotado de grandeza.

Quem é o senhor deste mundo?

Aquele cujas palavras são doces e benéficas e que segue o caminho da retidão.

Quem é que nunca corre nenhum perigo?

Aquele que segue as palavras dos sábios e mantém os sentidos sob controle.

Onde devemos viver?

Devemos viver com o sagrado.

O que um homem sábio deve evitar proferir?

Falsidades e palavras más contra os outros.

De que um homem deve lembrar-se?

Do santo nome de Deus.

Quais são os inimigos do aspirante espiritual?

A luxúria e a cobiça.

O que um homem deve proteger de todo dano?

Uma esposa fiel e seu próprio poder de discernimento.

Qual é a árvore que realiza todos os desejos?

Os ensinamentos do guru.

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